segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Aórdão do Tribunal da subturma 1

Procº nº 1-A/2010 BELSB
Acção Administrativa Especial
Acórdão
Data: 1712/2010
Intervenientes:
Autores: Somos de Inteira Confiança Lda e Francisco d’Esperto
Réu: Ministério da Administração Interna



PROCESSO Nº 1-A/2010 BELSB
ACÓRDÃO
RELATÓRIO
*
Francisco d’ Esperto (A) e Somos de Inteira Confiança,, Lda (B) e, interpuseram Acção Administrativa sob a forma de Processo Especial, tendo por objecto a aquisição de dois veículos blindados para serem utilizados, pelas forças policiais na Cimeira da Nato ocorrida a 19 e 20 de Novembro de 2010 (fls 2 e seguintes dos autos)

O autor A considera que, não tendo os veículos sido entregues no prazo necessário para a sua utilização, se tornaram absolutamente inúteis para o Estado Português,

Termina pedindo a condenação à prática de acto de resolução do contrato administrativo de fornecimento de veículos blindados e a devolução pela General Dynamics das quantias eventualmente já pagas.

Com a p.i. juntou documentos e arrolou como testemunha a Srª D. Albertina Costa.

O autor B considera que o contrato, celebrado entre o Ministério da Administração Interna,adiante designado por MAI, a “General Dynamics”, para o fornecimento de dois veículos blindados, para serem utilizados pelas forças policiais durante a cimeira da NATO (apesar de não ter sido resolvido pelo MAI, por incumprimento da entidade adjudicatária - por falta de entrega no prazo acordado), é anulável por violação de normas do procedimento concursal, considerando que o valor do contrato torna obrigatória a existência de um Concurso Público Internacional

Termina pedindo a declaração de anulação do contrato, por violação do procedimento concursal obrigatório e adjudicação por ajuste directo, bem como a condenação ao consequente lançamento de concurso público internacional de aquisição de 2 veículos blindados.

Com a p.i. juntou documentos e arrolou como testemunha a Srª D. Raquel Aiveca.

Foram prestadas no processo as informações oficiais tidas por convenientes.

O demandado, após notificação, para o efeito, apresentou contestação aos factos alegados pelo autor A, deduzindo excepção dilatória pela ineptidão da p.i e ilegitimidade do autor e, por impugnação, a matéria constante nos artºs 7º a 18º da p.i.(cfr fls 13 a 16 dos autos)

Apresentou, ainda, contestação quanto aos factos alegados pelo autor B, deduzindo igualmente excepção dilatória por ineptidão da p.i. e ilegitimidade do autor. Contestou por impugnação os factos alegados nos artºs 11º, 13º a 15º, 22º a 43º, 48º da p.i.(cfr. fls 17 a 20 dos autos)

O tribunal procedeu à inquirição das testemunhas arroladas pelos autores (cfr Acta junta a fls 3 a 17 dos presentes autos).

O Tribunal ordenou a abertura de vista ao Digno Magistrado do MP (cfr despacho exarado a fls 21 a 25 dos autos)

O Digno Magistrado do M.P. junto deste Tribunal, emitiu douto parecer no sentido de se manter o contrato, uma vez que, não obstante existir um vício procedimental, quanto à formação do contrato, será mais lesivo para o erário público a sua anulação e a subsequente abertura de novo procedimento concursal, invocando para o efeito o nº 4 do artº 283 do Código dos Contratos Públicos (CCP).
*


FUNDAMENTAÇÃO

Factos Provados

Da discussão da causa resultaram provados os seguintes factos com interesse para a sua decisão:

Foi celebrado entre o MAI e a General Dynamics um contrato de fornecimento de dois veículos blindados;
Os veículos blindados destinavam-se a ser utilizados na Cimeira da Nato, que teve lugar nos dias 19 e 20 de Novembro de 2010 em Lisboa;
O MAI adjudicou a compra através de ajuste directo;
O valor do contrato é de € 1 200 000,00;
A entrega dos veículos ocorreu após a data de realização da Cimeira;
Não se verificou a resolução do contrato;
O MAI manteve interesse em continuar com a compra;
*






Factos não provados

Dos factos, com interesse para a decisão da causa, constantes do processo e objecto de análise concreta, não se provaram os constantes nos quesitos 2 a 4.



Motivação da Decisão de Facto

A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, que dos autos constam e nos depoimentos das testemunhas arroladas pelos autores.
No entender deste Tribunal ficou provado, através dos depoimentos produzidos em audiência, bem como das provas documentais apresentadas pelo demandado (cfr anexo aos autos), que existe interesse na manutenção do contrato de aquisição dos veículos.
Atendendo ao princípio da livre apreciação da prova, considera este Tribunal que a resolução deste contrato acarretaria custos manifestamente desproporcionados para o erário público com a eventual indemnização a pagar ao contra-interessado.
Quanto às expectativas invocadas por B, entende este Tribunal que, as mesmas, não ficaram provadas pelo que não há lugar à indemnização pedida.
*

Questões que cumpre solucionar

Em face da matéria de facto provada, as questões que importa solucionar prendem-se com a análise dos fundamentos da acção que originou os presentes autos, devendo, igualmente o Tribunal examinar todas as questões, relevantes para a decisão da causa, que sejam de conhecimento oficioso (artº 660, nº 2 do Código do Processo Civil) ou que tenham sido alegadas pelos intervenientes processuais.
*

Enquadramento jurídico

Importa agora proceder à subsunção jurídica da matéria de facto provada em ordem a posterior decisão da causa.
Nos termos do nº 1 do artº 283 do CCP “os contratos são nulos se a nulidade do acto procedimental em que tenha assentado a sua celebração tenha sido judicialmente declarada, ou possa ainda sê-lo”.
No entanto, o nº 4 da citada norma refere que a nulidade pode ser afastada quando, ponderados os interesses públicos e privados em causa e a gravidade geradora do vício do acto procedimental, a anulação do contrato se revele desproporcionada ou contrária à boa fé ou quando se demonstre inequivocamente que o vício não implicaria uma modificação subjectiva no contrato celebrado nem uma alteração do seu conteúdo essencial.
*

Dispositivo


Face ao exposto, o Tribunal julga IMPROCEDENTES as acções deduzidas por Francisco d’ Esperto (A) e Somos de Inteira Confiança,, Lda (B).

Condenam-se os autores em custas.

Valor do processo para efeito de custas: € 1 200 000,00

Registe
Notifique

Lisboa, 17 de Dezembro de 2010.

Os Juízes de Direito,

Ana Luísa

Arlindo Varela

Bruno Espada

Carla Almeida

Fernando Canuto

José Alexandre

Luciana Ferreira

Manuel Estalagem

Palmira Estalagem

Susana Vital

domingo, 19 de dezembro de 2010

função preventiva ou função reactiva?

“ O peixinho vai nadando, vai nadando de mansinho, ele sobe e dá uma volta e continua o seu caminho”
Com todo o respeito pelo legislador do CPA, é a cantarolar esta música infantil que tento interpretar a letra da lei e o pensamento legislativo expresso no CPTA.
Na nova reforma do Contencioso Administrativo o legislador estabeleceu o regime jurídico dos meios processuais existentes, principal, cautelar e executivo, no ETAF (Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais) e no CPTA (Código do Procedimento nos Tribunais Administrativos). As acções previstas vêm exemplificar as pretensões específicas que podem ser feitas no âmbito da garantia constitucional de “ (…) tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo, nomeadamente, o reconhecimento desses direitos ou interesses, a impugnação de quaisquer actos administrativos que os lesem, independentemente da sua forma, a determinação da prática de actos administrativos legalmente devidos e a adopção de medidas cautelares adequadas.”, Art.º268.º, n.º4 da CRP.
O CPTA regula toda a tramitação jurisdicional, aplicando-se subsidiariamente o CPC (Código do Processo Civil) nas matérias que o art. 35.º do CPTA remete expressamente. Os meios processuais que o CPTA prevê são:
- acção administrativa comum, art. 37.º e SS.
-acção administrativa especial, art.46.º e SS.
-processos urgentes, art.97.º e SS.
-processos cautelares, art.112.º e SS.
-processo executivo, art.157.º e SS.
Cada um pretende tutelar uma pretensão específica (existe ainda a possibilidade de se fazer uma cumulação de pedidos, art.4.º e 5.º CPTA), reunindo os pressupostos, nomeadamente os relativos ao objecto (pedido e causa de pedir), legitimidade (activa e passiva), oportunidade e a competência dos tribunais, permitindo aos interessados ver os efeitos dos seus pedidos nas sentenças, com força de caso julgado.
Contudo, existem pedidos que parecem ser uma mistura de diferentes meios processuais, nomeadamente a acção comum e a acção especial, como o caso do pedido de condenação previsto no art.º37.º, n.º2, al. c) CPTA, chamada de “acção impositiva e acção inibitória” (Vieira de Andrade, e Mário Aroso de Almeida) ou “acção condenatória” (Vasco Pereira da Silva) prevista no art.º37.º, n.º2, al. c) CPTA com a seguinte redacção:“ Condenação á adopção ou abstenção de comportamentos, designadamente a condenação da Administração á não emissão de um acto administrativo, quando seja provável a emissão de um acto lesivo.”
Esta nova subespécie de acção administrativa comum vem ao encontro da evolução do Procedimento Administrativo e o surgimento da Administração Prestadora e Infra-estadual que tem como novos domínios de intervenção, como o ambiente, urbanismo, ordenamento do território, etc. Porque permite condenar a Administração por qualquer comportamento que seja lesivo aos direitos e interesses dos cidadãos.
Este pedido é feito no âmbito da acção comum, forma de processo principal, cuja delimitação é feita na negativa, por exclusão ” (…) nem neste Código nem em legislação avulsa, sejam objecto de regulação especial”. A natureza dos pedidos são variados, de simples apreciação (al. a), b)), pedidos de condenação (al. c), d), e), f), g), e existe combinação de pedidos de simples apreciação, constitutivos e os de condenação al. h), i), j) e o n.º3, art.37.º do CPTA.
Mas a al. c) expressa a possibilidade de se condenar a Administração a adoptar ou a abster-se de determinados comportamentos, como por ex. emitir actos administrativos, que podem ser lesivos. O que levanta a algumas dúvidas, pois corre-se o risco de confundir este meio comum com outro meio processual, o especial que tem como objecto, pedidos relativos á prática ou omissão ilegal de actos administrativos art.º46.º, n.º1 CPTA.
Segundo a doutrina esta norma comporta 2 acções:
1º acção inibitória, que visa impedir a consumação de um comportamento lesivo da Administração;
2ºacção impositiva, que visa obrigar a Administração a adoptar medidas de conteúdo positivo quando sejam adequadas a evitar o risco de lesão na sua esfera jurídica;
a)Que comportamentos podem e devem ser abrangidos neste pedido de condenação?
Mário Aroso de Almeida e Vieira de Andrade adoptam uma noção ampla de comportamentos, que abrange todas as actuações públicas: as técnicas, as informais, as operações material, incluindo os actos administrativos, e os simples actos jurídicos ( ex. abertura de concursos, fixação de prazos, etc.). Apenas divergem na forma de utilização deste pedido, Vieira de Andrade restringe este pedido nas impossibilidades de tutela através da acção especial, e para a defesa de direitos absolutos (direitos, liberdades e garantias, direitos pessoais ou os de propriedade, e os direitos da comunidade no âmbito da acção popular. Mário Aroso de Almeida não restringe aos direitos absolutos, para ele serve para a tutela de qualquer direito ou interesse, desde que se demonstre o interesse processual qualificado, e que esta acção seja o meio idóneo a obter uma sentença que não seria eficazmente obtida através da impugnação de actos na acção especial (que tem uma função reactiva) e nem através de recurso a providências cautelares. Assim o autor tem que convencer o tribunal do seu interesse qualificado, baseado na situação de risco e na possível produção de danos da conduta da Administração, e convencer o tribunal da utilização desta tutela preventiva, que é necessária, mas não é tão urgente que requeira uma tutela cautelar.
O Prof. Vasco Pereira da Silva, embora procure “um sentido útil ” á exemplificação da 2ªparte da norma, “ (…) á não emissão de um acto administrativo (…)”, admite em termos excepcionais esta tutela de actos administrativos na acção comum . Mas deixa a critica de que incluir os actos administrativos na acção comum, é mais uma prova dos “traumas de infância” e das influências (das “sessões de grupo”) do Direito Alemão, porque o sistema germânico é diferente do português. Assim é favorável á ideia de acção preventiva de actos administrativos apenas na acção especial.
Em suma, esta acção inibitória e impositiva, tem uma função preventiva por isso que se distingue da acção especial, impugnação de actos administrativos, que tem uma função reactiva, posterior a emissão do acto. Mas distingue-se da acção cautelar, que também tem um a função preventiva, pois é definitiva e não provisória. E apenas é admissível nos casos de fundado receio de violação dos direitos dos cidadãos, por parte de um futuro comportamento da Administração.
Bibliografia
-Almeida, Mário Aroso de / Cadilha, Carlos “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos” 3ª edição, Almedina, 2010, pag.232 e SS.
-Andrade, Vieira de “ Justiça Administrativa (Lições) ”, 3ªedição, Coimbra, 2000 pag. 185 e SS.
-Silva, Vasco Pereira da “ A acção para o Reconhecimento de direitos” em Cadernos de Justiça nº16, Julho - Agosto 1999 pag. 41 e SS.
- Silva, Vasco Pereira” O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise”, 2ªedição, Almedina, Coimbra, 1998 pag. 449 e SS.


Trabalho realizado por: Carla Varela, nº 15439, 4ºano noite, subturma 1

O peixinho foi nadando e concluiu o seu caminho ;-)

Boas férias e boas festas.

A acção administrativa comum no contencioso administrativo português

No ordenamento jurídico português desde há muito que os processos que tocam não só na responsabilidade civil da Administração mas também em litígios sobre contratos administrativos, são resultantes daquele que ficou conhecido no nosso contencioso administrativo como o contencioso das acções.
Relacionado com questões que não envolviam a fiscalização de manifestações do poder de autoridade da Administração, e que por isso não integravam o núcleo central da jurisdição administrativa, então refém de um meio processual próprio, o recurso contencioso, aquele contencioso era, por isso, conhecido como o contencioso por atribuições. Embora confiada à competência dos tribunais administrativos, sempre se pensou, no mínimo teoricamente, que ela podia ter sido entregue à dos tribunais comuns. Além de que, uma vez caracterizada pela falta de especificidades, a tramitação dentro dos processos não seguia um modelo próprio do contencioso administrativo, antes do processo declarativo comum, naturalmente previsto no Código do Processo Civil.
A realidade é, agora, diferente. Os litígios que integravam o tal contencioso por atribuição são, actual e naturalmente, considerados litígios emergentes de relações jurídico-administrativas, algo cuja apreciação está, segundo a lei das leis portuguesas, a Constituição, atribuída aos tribunais administrativos. Contudo, e dentro das fronteiras da jurisdição administrativa, o próprio CPTA mantém a distinção entre os litígios que atingem a realidade do exercício de poderes de autoridade por parte da administração, apesar ainda e também intimamente ligados à prática ou omissão de acto administrativo ou de normas, e os outros que de todo não se fazem acompanhar daquela primeira característica – o de mesmo que infimamente estarem em conexão com a prática ou a omissão de acto administrativo.
Não podendo ser considerados, por si, como elementos suficientes para constituírem o núcleo duro da jurisdição administrativa, os primeiros daqueles litígios encerram questões e ainda colocam exigências que justificam uma atenção especial, atenção essa que se traduz na existência de uma forma processual exclusiva do contencioso administrativo, a acção administrativa especial, que naturalmente nada mais tem por objectivo do que regular a tramitação daquele tipo de processos. Já os segundos não necessitam desse tipo de proteccionismo no que à sua tramitação concerne e é por essa fundamental razão que o CPTA os confina à acção administrativa comum, forma essa obediente ao disposto no processo declarativo do Código Processo Civil.
A acção administrativa comum encontra correspondência, assim, num meio processual que apesar de poder terminar com sentenças condenatórias, de simples apreciação e constitutivas, acolhe também todos os litígios jurídico-administrativos excluídos pelas especificidades dos restantes meios processuais.
Assim, ao sustentar que com o CPTA certas pretensões seguem a forma da acção administrativa comum, está a dizer-se implicitamente que a tramitação dessas pretensões se rege pela forma de processo declarativa do Código de Processo Civil.
A acção administrativa comum abrange, por isso e primeiro que tudo, o contencioso das acções em matéria da responsabilidade civil extracontratual e em matéria contratual – tal como determinam as alíneas f) e h) do n.º 2 do art.º 37 do CPTA. É por esta razão que parte das disposições particulares do código, no universo restrito da acção administrativa comum, diz respeito a estes processos.
Entre aquelas disposições, merece ser destacado o art.º 40.º que aumenta consideravelmente a legitimidade para fazer valer a invalidade, seja ela total ou parcial, dos contratos celebrados pela Administração Pública e para levantar questões relativas à execução desses contratos muito para lá das partes na relação contratual.
Além das acções de responsabilidade e sobre contratos, a acção administrativa comum é a forma que corresponde a todo e qualquer processo em que se pretenda a condenação da administração ao cumprimento de deveres de prestar que não envolvam a emissão de um acto administrativo impugnável, nem devam ser alvo de um dos dois processos urgentes de intimação que o código prevê nos seus art.ºs 104 e ss.
A acção administrativa comum acolhe ainda acções não nominadas – às quais se referia anteriormente o art.º 73.º da LPTA – e que podem ser, nomeadamente, intentadas por entidades públicas contra outras entidades públicas ou ainda contra particulares. Aliás, o elenco exemplificativo das pretensões passíveis de encontrar abrigo na acção administrativa comum que se encontra no n.º 2 do art.º 37 do CPTA não pretende mais do que clarificar o sentido da fórmula genérica enunciada no n.º 1, esclarecendo os interessados sobre alguns dos principais tipos de pretensões que, individualmente ou em conjunto, podem tentar concretizar através da acção administrativa comum.

Luís Miguel Santos
Aluno n.º 17635

sábado, 18 de dezembro de 2010

Administração: uma parte no processo, ou parte suprema?

Administração: uma parte no processo, ou parte suprema?
O exemplo do art.º 45 CPTA

Verificam-se situações em que realmente a Administração não pode ser considerada como mera parte no processo, sendo antes, uma parte com vantagens e supremacia em relação às outras partes. Pergunta-se: como compatibilizar as prerrogativas da Administração, em nome do interesse público, com a igualdade das partes, plasmado no art.º 6º CPTA, que necessariamente deve decorrer do princípio geral da igualdade?
Se o Contencioso Administrativo fez uma viragem para uma vertente subjectivista, que poderíamos considerar subjacente aos n.ºs 4 e 5 do art.º 268 da CRP, tentando garantir a efectiva tutela dos direitos dos particulares face à Administração, como entender que, em face de um direito reconhecido, se venha a denegá-lo, submerso no mar do interesse público?
Assim, como dizer que há uma completa viragem, desde o contencioso de mera legalidade, centrado no acto administrativo definitivo e executório, até à tutela plena dos direitos dos particulares?
Mais - como dizer que há efectivamente a defesa da legalidade, numa perspectiva igualitária, quando se considera o caso de um acto anulável, cuja anulação foi requerida ao Tribunal, por parte com legitimidade para tal, e o Tribunal julga improcedente a acção, em prol do interesse público?
É o caso previsto, por exemplo, no art.º 45º CPTA: o Tribunal pode verificar que um acto deveria ser anulado, mas não o anula, pelo facto de causar excepcional prejuízo ao Estado. Se por um lado se compreende que o prejuízo causado ao Estado é, em última medida, causado a todos os cidadãos, por outro lado, poderemos estar em presença de um mecanismo que permite a fraude à lei. Vejamos um exemplo: a Administração celebra, por algum motivo, um contrato para aquisição de serviços através de ajuste directo, que poderá não ser a melhor escolha do ponto de vista do interesse público, podendo, enquanto o faz, lesar direitos de particulares; além disso, acrescentemos a hipótese desta celebração ser feita ilegalmente, i.e., não respeitando os requisitos para a escolha do ajuste directo. Se a posteriori o Tribunal não o anula, poderemos dizer então que a última palavra cabe no fundo à Administração, que poderá praticar actos ilegais, que lesam interesses de particulares, e que esses actos se manterão na ordem jurídica, em nome do interesse público… e o interesse público na manutenção da “legalidade material” (e não formal, visto que, neste caso, existem normas que assim o permitem) e na boa administração da justiça?
A sentença proferida na sequência de um pedido deve tutelar os direitos subjectivos (no seu sentido amplo), defender a legalidade e o interesse público na boa administração da justiça. No exemplo atrás referido, parece difícil dizer que esses objectivos foram cumpridos – parecem, ao invés, ter sucumbido em face do interesse público.
O art.º 45º do CPTA - bem como outros já apontados em comentário anterior, como o art.º 120º e o 73/2 do mesmo código, parecem não ser totalmente consistentes com a defesa dos direitos dos particulares, e o caminho que traçam merecerá ser alvo de crítica.
Assim, como se pode ler no Ac. TCAN, proferido no processo 01070/04.1BEBRG:
O “(…) art.º 45º do CPTA, o qual, como apontado já no aludido requerimento da recorrente de 13/07/2005, é um preceito ferido de inconstitucionalidade; (…) E isto porque viola não só o princípio constitucional da separação de poderes, estabelecidos no art.º 111 da CRP; (…) Mas também os princípios processuais da estabilidade da instância, do pedido e da conformação do pedido com a decisão de mérito arts. 268º, 272º, 273, 660, n.º 2 e 661º n.º 1 do CPC, constitucionalizados pelo art. 20º da dita CRP – Cfr. Dr. Vasco Pereira da Silva e Prof. Dr. José Lebre de Freitas, in texto da alegação e notas de rodapé (…)”.
De facto, a norma permite que os Tribunais possam desconsiderar o que está cominado na lei com a sanção da anulabilidade. E mais permite – indirectamente, permite que a Administração faça o mesmo, como no exemplo atrás exposto, ao que nos parece, em violação do princípio de separação de poderes consagrado no art.º 111º da CRP. Assim, em vez de termos um sistema em que directamente julgar era administrar, indirectamente, consegue-se o mesmo resultado.
Pelo que, deste ponto de vista, a constitucionalidade do art.º 45º do CPTA poderá (ou deverá…) ser sindicável junto dos tribunais que a aplicam a um caso concreto, através do mecanismo da fiscalização concreta, nos termos do art.º 204 da CRP.
A reforma do contencioso administrativo que, segundo o Prof. Dr. Vasco Pereira da Silva, foi no sentido da europeização e constitucionalização do Processo Administrativo, parece ainda não ter colmatado todas as deficiências do sistema.
Se se continuar a permitir que em nome do interesse público se convalidem de certo modo actos ilegais, a Administração não será obrigada a caminhar para a auto-responsabilização que seria desejável. De facto, haveria porventura outros mecanismos para atingir o mesmo fim de salvaguarda do interesse público, como seja o mecanismo previsto no art.º 6º do Regime da Responsabilidade Civil extracontratual do Estado e Demais entidades Públicas, i.e., o direito de regresso do Estado contra funcionários. O interesse público é antes de mais, garantir que o Estado não cometa actos ilegais, ainda mais quando lesivos do erário público (como no caso da celebração de contratos usando o procedimento de ajuste directo, fora dos casos permitidos por lei). A ratio subjacente à restritividade com que é admitido este procedimento é precisamente a de garantir o respeito pela concorrência, igualdade e transparência, de que o concurso público dá mais garantias. E não só garante melhor os interesses de particulares que porventura queiram aceder ao concurso, mas também dará maior garantia de conseguir um melhor negócio para o Estado.
O que se pretende com este exemplo é salientar o facto de não ser só o concorrente o lesado – o Estado também - pelo que, indirectamente, também todos os cidadãos.
Nas palavras do Prof. Dr. Vasco Pereira da Silva, “(…) A “dependência da realidade” do Contencioso Administrativo obriga, assim, a prestar uma atenção redobrada à prática, para apreciar o modo como a reforma vai ser interpretada e aplicada pelos “sujeitos” da Justiça Administrativa – magistrados, advogados, juízes, professores universitários, mas também administrações públicas e privados lesados ou simplesmente interessados. Se a nossa época jurídico-administrativa pode ser caracterizada como a “idade das reformas” (Cassese), as quais podem e devem ser apreciadas em razão da bondade e da coerência das opções tomadas pelo legislador (nacional, mas também europeu), todavia, a respectiva eficácia fica grandemente dependente dependente dos operadores jurídicos, que são quem – em última análise – “criam o direito” na sua aplicação”. In Silva, Vasco Pereira da, “O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise”, 2ª ed. Almedina, 2009.
Neste sentido, pergunto-me acerca da bondade da decisão a que se chega – de forma legal, diga-se – quando o juiz declara improcedente o pedido de anulação de um acto anulável, sem que haja qualquer obstáculo a isso, sem ser o interesse público.
Não se quer com isto dizer que o interesse público não deverá pesar na balança, mas que o próprio conceito de interesse público não se deverá limitar a prejuízos eventualmente de ordem meramente económica; A consideração deste conceito como tal (de forme redutora) poderá levar à preterição do interesse público, em nome do… interesse público ele mesmo. Assim, como atrás se disse, existe um interesse público na boa administração da justiça, na auto-responsabilização da Administração e seus funcionários, que deverá estar sempre presente num Estado de Direito. Eventualmente, “moralizando o sistema”, garantir-se-á um melhor “interesse público”.
A aluna,
Isilda Cunha
N.º 17623

Problema de legitimidade a mais?

O princípio basilar da actuação da Administração é o da prossecução do interesse público. É este o princípio motor da Administração pública[1].
A evolução do contencioso administrativo tem vindo a estabelecer uma cada vez maior subjectivização do processo, estabelecendo como critério principal de determinação de legitimidade activa o ser parte na relação material controvertida. Com a subjectivização do contencioso, o particular recorre ao contencioso administrativo para a prossecução do seu interesse particular.
Destas duas simples considerações é possível determinar o conflito de interesses entre o interesse público e privado em causa no contencioso administrativo.
É de acrescentar ainda o nº 2 do art.9º do CPTA que atribui legitimidade activa a “qualquer pessoa… tem legitimidade para propor e intervir, nos termos previstos na lei, em processos principais e cautelares destinados à defesa de valores e bens constitucionalmente protegidos” elencando alguns dos valores constitucionalmente protegidos. No fundo, o interesse em causa não é um interesse particular mas pode ser um interesse difuso, comunitário, colectivo ou até interesses individuais homogéneos[2]. Este aspecto parece vir na linha da distinção constitucional entre "direitos e interesses legítimos" (art. 20º nº 1da CRP) ou entre "direitos e interesses legalmente protegidos" (art. 268º nº 5 da CRP).
No caso das acções populares a problemática deve centrar-se na tensão que pode surgir da confrontação do interesse público da actuação da administração e do interesse público invocado pelo particular no âmbito da acção popular.
Apresentam-se duas questões que se têm por pertinentes neste contexto de evolução do contencioso:
1 - Deve a impugnação judicial da actuação da Administração ceder no caso de se verificar que o resultado da sentença acarreta um custo superior ao benefício resultante da reposição do direito subjectivo?
2 - Devem os custos do recurso ao processo judicial de impugnação de uma actuação incluir o custo de oportunidade de o tribunal ser ocupado com uma questão que poderá não ter um efeito útil ou considerar a legitimidade de tal forma abrangente que permita a qualquer pessoa recorrer ao contencioso invocando uma interpretação abrangente dos princípios constitucionais a proteger pelas acções populares?
A resposta a estas questões depende da análise de duas problemáticas fundamentais, a questão de o interesse público poder prevalecer sobre o interesse particular e a segunda de saber se o alargamento da legitimidade pode colocar em causa o direito fundamental do acesso à justiça em tempo útil.
O princípio Constitucional da tutela jurisdicional  efectiva previsto no art. 20.º da Constituição da República Portuguesa nas suas vertentes do acesso ao direito e aos tribunais e na sua vertente do direito a obter uma decisão judicial em prazo razoável deve ser o escopo de um Contencioso Administrativo orientado para a utilidade das decisões judiciais.

A questão da utilidade do processo e a utilidade da actuação da administração devem ser vectores chave para um Estado eficiente. O alargamento do objecto do processo e a subjectivizaçãoatribui ao particular prorrogativas que permitem ser utilizadas no sentido da colaboração ou da mera entropia do sistema de decisão e acção da Administração mas no limite poderão haver cerca de dez milhões de potenciais autores para cada situação. Para estabelecer este controlo de acesso de utilização da acção popular estabeleceu-se que esta poderia ter lugar no âmbito da defesa de valores e bens constitucionalmente protegidos.
A legitimidade activa para o controlo do exercício da Administração tem de estar directamente relacionada com a ideia de justiça e de conveniência das actuações da própria Administração mas para que o processo seja adequado ao fim a que se destina e não se pode configurar como um mero expediente dilatório da actuação da Administração.
O CPTA criou as condições do alargamento do processo para garantir a possibilidade de os particulares obterem uma verdadeira e efectiva garantia dos seus direitos violados pela Administração bem como, da possibilidade de os particulares recorrerem à justiça não no âmbito de um interesse próprio mas num interesse geral da comunidade, mas cabe especialmente à Jurisprudência a utilização do processo com o objectivo de que ele seja útil e um verdadeiro garante dos direitos violados pela Administração.
Neste âmbito, também a doutrina terá um papel relevante na concretização do modelo actualmente em vigor e no fornecimento de elementos que ajudem a utilizar de forma adequada os valiosos recursos que a recente reforma do contencioso administrativo acrescentou à nossa ordem jurídica.
Não podemos correr o risco de ter evoluído de um sistema arcaico do mero controlo da legalidade do acto para um sistema altamente garantístico que resulte num completo entupimento dos tribunais com acções sem a mínima utilidade. A chave deste equilíbrio está na legitimidade activa no e na sua definição pela utilidade da decisão.

Bibliografia:
 SILVA, Vasco Pereira da (2009); O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, 2ª edição; Almedina;
AMARAL, Diogo Freitas do (2001); Curso de Direito Administrativo, volume II, 2ª edição; Almedina;
 ANDRADE, José Carlos Vieira de (2007); Justiça Administrativa, 9ª edição; Coimbra Editora


[1] Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, vol. II, p33
[2] Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa, 10ª edição, p177

Nuno Mira Rodrigues
ST1
Aluno N.º 17697

O Vislumbre da Reforma Administrativa Angolana

O primeiro vislumbre da reforma administrativa Angolana ocorreu no ano de 1990 com a aprovação da Lei nº 17/90, à qual se seguiu uma ' explosão legislativa ' , entre 1991 e 1994.
No entanto, o primeiro programa de reforma foi aprovado apenas no ano 2000, o que demonstra as dificuldades no percurso para a modernização administrativa Angolana, sem contudo esta deixar de ser vista como uma prioridade, como o próprio Programa de Reforma Administrativa refere " (...) as reformas institucionais prefiguram-se como das mais importantes nesta fase de transição para a economia de mercado, no preciso sentido de preparar a Administração do Estado para o exercício correcto da política (...)"
A Lei nº 17/90 cumpriu também a árdua tarefa de diferenciação do sector público administrativo e do sector privado, pois até esta, todos os trabalhadores estavam sujeitos ao regime da lei geral do trabalho e perante um processo de evolução em curso esta era uma tarefa inadiável.
É possível afirmar que a ' explosão legislativa ' em muito irá continuar a contribuir para a evolução Administrativa Angolana, no entanto, parece que a maior dificuldade será mesmo ao nível dos recursos humanos, pois quer os funcionários, quer os respectivos serviços são ainda pouco especializados o que leva na prática a uma certa resistência dos serviços, em geral, a respeitar a legislação actual.
Contudo, a Constituição enquanto Lei Suprema e Fundamental da República de Angola, veio alterar o sistema político-administrativo, no entender do Professor Cremildo Paca, docente da Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto, será no seu seguimento que irá ser desenvolvido o novo ordenamento jurídico Angolano.
Espera-se que também os tribunais, os juízes e todos os serviços sejam alargados, para que a resposta em relação a esta matéria seja concretizada com a maior brevidade e sucesso.


Cátia Branco Oliveira
Aluna nº 17234

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

TRAMITAÇÃO EM CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO

Nas acções administrativas comuns e administrativas especiais existem diferenças de características e de valor que implicam que os procedimentos a adoptar no desenrolar do processo sejam, necessariamente, diferentes.
Aos casos previstos no Titulo II do CPTA (art.º 37º e ss) corresponde o processo de declaração regulado pelo CPC nas formas, ordinária, sumária e sumaríssima.
Os casos previstos nos Títulos III e IV do CPTA (art.º 46º e seguintes e 97º e seguintes), regem-se pelas disposições aí previstas e pelas disposições gerais, sendo subsidiariamente aplicável o disposto na lei processual civil, correspondendo as seguintes formas de processo:
Acção Administrativa especial; Contencioso eleitoral; Intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões; Intimação para protecção de direitos liberdades e garantias.
Embora a tradição do nosso contencioso administrativo seja a de remeter, no contencioso das acções sobre contratos e responsabilidade, para o processo civil de declaração na forma ordinária, a remissão, passa, contudo, a ser feita também para a forma sumária e para a forma sumaríssima, em função do valor da causa.
O processo começa pela apresentação na secretaria do Tribunal competente, em regra por advogado, de uma petição inicial, a qual pode ser entregue na secretaria judicial (art.º 150º, nº1 alínea b) do CPC), por telecópia (art.º 150º nº1, alínea c) do CPC e DL. Nº 28/92, de 21/02), correio electrónico, com aposição de assinatura electrónica avançada, sendo a data de expedição a que demarca o inicio da instância (art.º 267º, nº 1 do CPC) e envio através de outro meio de transmissão electrónica de dados (art.º 150º, nº 1 alínea e) do CPC).
A secretaria que receber a petição terá que verificar se estão observados os requisitos do disposto no art.º 467º do CPC, ou seja, a designação do Tribunal onde a acção é proposta e identificação das partes, nomes, domicílios e, sempre que possível, profissões e locais de trabalho; a indicação do domicilio profissional do mandatário judicial; indicação da forma de processo; exposição dos factos e das razões de direito que servem de fundamento à acção; a formulação do pedido bem como a declaração do valor da causa.
Caso a secretaria judicial recuse o recebimento da p.i. deverá indicar por escrito, o fundamento da rejeição, do qual cabe reclamação para o juiz, podendo ser interposto recurso de agravo do despacho que confirmar ou não o recebimento (art.º 475º do CPC), à parte é facultada a possibilidade de entrega de nova petição ou de documentos em falta dentro dos 10 dias seguintes à recusa de recebimento ou à notificação da decisão judicial que a tenha confirmado (art.º 476º do CPC).
Seguem a forma de acção administrativa comum os processos que tenham por objecto litígios cuja apreciação se inscreva no âmbito da jurisdição administrativa e que, nem no CPTA, nem na legislação avulsa, sejam objecto de regulação especial (nº1).
Seguem designadamente a forma de acção administrativa comum os processos que tenham por objecto litígios relativos a (nº2), Reconhecimento de situações jurídicas subjectivas directamente decorrentes de normas jurídico-administrativas ou actos jurídicos praticados ao abrigo de disposições de direito administrativo; de Reconhecimento de qualidades ou do preenchimento de condições; as de Condenação à adopção ou abstenção de comportamentos, designadamente a condenação da administração à não emissão de um acto administrativo, quando seja provável a emissão de acto lesivo; Condenação da Administração à adopção das condutas necessárias ao restabelecimento de direitos ou interesses violados; Condenação da Administração ao cumprimento de deveres de prestar que directamente decorram de normas jurídico-administrativas e não envolvam a emissão de um acto administrativo impugnável, ou que tenham sido construídos por actos jurídicos praticados ao abrigo de disposições de direito administrativo, e que podem ter por objecto o pagamento de uma quantia, a entrega de uma coisa ou a prestação de um facto; as de Responsabilidade Civil das pessoas colectivas, bem como dos titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, incluindo acções de regresso; as de Condenação ao pagamento de indemnizações decorrentes da imposição de sacrifícios por razões de interesse público; as de Interpretação, validade ou execução de contratos; as de Enriquecimento sem causa, assim como as provenientes de Relações Jurídicas entre entidades administrativas.
Quando, sem fundamento em acto administrativo impugnável, particulares, nomeadamente concessionários, violem normas de direito administrativo ou vínculos jurídico-administrativos contratualmente assumidos, ou haja fundamento receio de que os possam violar, sempre que solicitadas a faze-lo, as autoridades competentes tenham adoptado as medidas adequadas, qualquer pessoa ou entidade cujos direitos ou interesses sejam directamente ofendidos pode pedir ao Tribunal que condene os mesmos a adoptarem ou a absterem-se de certo comportamento, por forma a assegurar o cumprimento das normas em causa.
A tramitação que se entendeu qualificar como “especial”, por contraposição à tramitação comum, por obedecer a um modelo especifico, próprio do contencioso administrativo, e que, embora com diversas adaptações que o aproximam da forma de processo “comum”, resulta da fusão das duas formas de tramitação do recurso contencioso de anulação que se encontravam previstos nas alíneas a) e b) do art.º 24º da LPTA revogada.
A acção administrativa especial caracteriza-se pelo facto de se reportar à prática ou omissão de actos administrativos ou de normas.
Os prazos de impugnação vêm previstos no art.º 58º do CPTA e tem lugar no prazo de 1 ano, se promovido pelo Ministério Publico e de 3 meses nos restantes casos.
À contagem dos prazos para a propositura da acção, aplicam-se as regras do art.º 144º, nº 1,2,3 e 4 do CPC (cf. art.º 58º, nº3 do CPTA), contando-se de forma continua, suspendendo-se, durante as férias judiciais, salvo se a duração for igual ou superior a seis meses, o que acontece com o prazo do Ministério Publico ou nos casos previstos no nº4 do art.º 58º do CPTA.
O processo é apresentado na secretaria do tribunal competente de uma petição inicial de acordo tal como de forma comum o que dispõe o art.º 150º nº1 do CPC.
Incumbe à secretaria promover de forma oficiosa e em simultâneo as diligências destinadas à citação sem necessidade de despacho prévio (art.º 81º do CPTA) da entidade pública demandada e dos contra-interessados, para contestarem em 30 dias
Quando por erro cometido na petição inicial, seja citado um órgão diferente daquele que praticou ou devia ter praticado o acto, o órgão citado deve dar imediato conhecimento àquele que o deveria ter sido (nº2), neste caso a entidade demandada beneficia de um prazo suplementar de 15 dias para apresentar a contestação e enviar processo administrativo (nº3)
Quando os contra-interessados sejam em numero superior a 20 (art.º 82º CPTA), o tribunal pode determinar que a respectiva citação seja feita mediante publicação de anuncio, com a advertência de que os interessados dispõem do prazo de 15 dias para se constituírem como contra-interessados no processo, expirado este prazo de 15 dias, os contra-interessados consideram-se citados, devendo contestar, querendo, no prazo de 30 dias.
O Ministério público continua a exercer a acção pública nos termos de sempre, podendo, também assumir a posição de autor, requerendo o seguimento do processo que, por decisão ainda não transitada, tenha terminado por desistência ou outra circunstância própria do autor. Mas é eliminada a vista final que sempre foi praticada quando esteve em vigor a LPTA, bem como a possibilidade de estar presente nas sessões de julgamento (art.º 62º CPTA).
No momento da citação da entidade demandada e dos contra-interessados, é fornecida cópia da petição e dos documentos que a instruem ao Ministério Publico, salvo nos processos em que ele figure como Autor.
Os poderes de intervenção do Ministério Publico podem ser exercidos até 10 dias após a notificação da junção aos autos do processo administrativo ou, não havendo lugar a esta, da apresentação das contestações.
Para o caso de intervenção do MºPº nos termos previstos, serão as partes notificadas dessa mesma intervenção, com cópias (cfr.parte final do nº5 da disposição legal citada.).
Findos os articulados, com a junção da contestação da entidade publica demandada, das contestações dos contra-interessados se os houver, e apensado o processo administrativo, a secretaria dá cumprimento oficioso ao disposto nos artigos 84º, nº6 do CPTA e art.º 526º do CPC, com notificação ao autor da apensação do processo instrutor bem como dos documentos juntos com a contestação, aproveitando-se para enviar as cópias das contestações apresentadas (art.º 152º, nº2 ultima parte do CPC, ficando os autos a aguardar por 10 dias que o Autor venha requerer o que tiver por conveniente.
As partes podem apresentar articulado superveniente, até à fase de alegações, ou quando o articulado se funde na junção ao processo de elementos até aí desconhecidos ou aos quais não tinha sido possível o acesso no prazo de 10 dias posteriores à notificação da junção dos referidos elementos.
Recebido o articulado superveniente, são as partes notificadas pela secretaria para responder no prazo de 10 dias (art.º 86º nº4).
Consagra-se o dever de o juiz proferir despacho de suprimento de excepções dilatórias e aperfeiçoamento dos articulados, dirigido a promover a prossecução da causa e o julgamento de mérito. Ainda a previsão da possibilidade de proferir despacho saneador, em que se impõe ao juiz o dever de conhecer de qualquer questão prévia, cuja apreciação deixa de poder ter lugar em momento ulterior e, portanto, de poder ser remetida para decisão final; mas em que o tribunal também pode conhecer, total ou parcialmente, do mérito da causa, bem como ordenar a abertura de um período de produção de prova.
Findos os articulados, ou o prazo para a sua apresentação, supridas as excepções dilatórias e aperfeiçoados os articulados se for caso disso (art.º 88º CPTA) vai o processo concluso ao juiz, o qual profere despacho quando deva conhecer obrigatoriamente, ouvindo o autor em 10 dias, de todas as questões que obstem ao conhecimento do processo; conhecer total ou parcialmente do mérito da causa e ainda quando entende ser de ordenar a abertura de um período de produção de prova. (art.º 87º do CPTA)
No caso de não poder conhecer do mérito da causa no despacho saneador, o juiz relator pode ordenar as diligências de prova que considere necessárias para o apuramento da verdade.
São admitidos em qualquer processo do contencioso administrativo todos os meios de prova que são admitidos na jurisdição comum, podendo no entanto o juiz indeferir, mediante despacho fundamentado, requerimentos dirigidos à produção de prova sobre certos factos ou recusar a utilização de certos meios de prova, quando tal se afigure claramente desnecessário. (art.º 90 CPTA)
O art.º 91º do CPTA introduziu a possibilidade de existir uma audiência pública para o debate oral sobre a matéria de facto e de direito, quando requerida pelas partes ou determinada pelo juiz.
Assim, finda a produção de prova, quando esta tenha lugar, pode o juiz ou relator, sempre que a complexidade da matéria o justifique, ordenar oficiosamente a realização de uma audiência pública destinada à discussão oral da matéria de facto.
A audiência pública pode também ter lugar a requerimento de qualquer das partes, podendo no entanto o juiz recusar a sua realização, mediante despacho fundamentado, quando entenda que ela não se justifica por a matéria de facto, documentalmente fixada, não ser controvertida.
Caso a audiência pública se realize por iniciativa das partes, nela são também deduzidas, por forma oral, as alegações sobre a matéria de direito.
O nº 4 do art.º 91º do CPTA dispõe que são facultativas as alegações.
Quando a audiência pública não tenha lugar por iniciativa das partes e estas não tenham renunciado à apresentação de alegações escritas nos termos do nº 4 do art.º 78º do CPTA, são notificados o autor, pelo prazo de 20 dias e depois simultaneamente, a entidade demandada e os contra-interessados, por igual prazo, para querendo as apresentar.
O Juiz deve providenciar pela marcação das datas de diligências mediante prévio acordam com os mandatários judiciais que devam comparecer (art.º 155º do CC), para o que pode encarregar a secretaria de realizar de forma expedida os contactos prévios necessários.
Quando a marcação não possa ser feita com prévio acordo dos mandatários judiciais, devem estes, se impedidos noutro serviço judicial já marcado, comunicar o facto ao tribunal, no prazo de 5 dias, propondo datas alternativas, datas estas que deverão ser sugeridas após contacto com os restantes mandatários interessados.
Por forma a favorecer a qualidade das decisões dos tribunais administrativos e Fiscais e alguma uniformidade na resolução de diferentes processos sobre a mesma matéria, permite-se que, sempre que a apreciação de um tribunal administrativo e fiscal se coloque uma questão de direito nova, que suscite dificuldades serias e possa vir a ser suscitada noutros litígios, o respectivo presidente determine que o julgamento se processe com a intervenção que todos os juízes do tribunal e que possa pedir ao Supremo Tribunal Administrativo, no âmbito de um reenvio prejudicial, que este indique o sentido em que a questão deve ser decidida.
Ocorrendo o julgamento com a intervenção de todos os juízes, sendo o quórum de dois terços, o relator determina a extracção de cópia das peças processuais que relevem, as quais são entregues a cada um dos juízes que devam intervir no julgamento, permanecendo o processo depositado na secretaria, para consulta.