segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Aórdão do Tribunal da subturma 1

Procº nº 1-A/2010 BELSB
Acção Administrativa Especial
Acórdão
Data: 1712/2010
Intervenientes:
Autores: Somos de Inteira Confiança Lda e Francisco d’Esperto
Réu: Ministério da Administração Interna



PROCESSO Nº 1-A/2010 BELSB
ACÓRDÃO
RELATÓRIO
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Francisco d’ Esperto (A) e Somos de Inteira Confiança,, Lda (B) e, interpuseram Acção Administrativa sob a forma de Processo Especial, tendo por objecto a aquisição de dois veículos blindados para serem utilizados, pelas forças policiais na Cimeira da Nato ocorrida a 19 e 20 de Novembro de 2010 (fls 2 e seguintes dos autos)

O autor A considera que, não tendo os veículos sido entregues no prazo necessário para a sua utilização, se tornaram absolutamente inúteis para o Estado Português,

Termina pedindo a condenação à prática de acto de resolução do contrato administrativo de fornecimento de veículos blindados e a devolução pela General Dynamics das quantias eventualmente já pagas.

Com a p.i. juntou documentos e arrolou como testemunha a Srª D. Albertina Costa.

O autor B considera que o contrato, celebrado entre o Ministério da Administração Interna,adiante designado por MAI, a “General Dynamics”, para o fornecimento de dois veículos blindados, para serem utilizados pelas forças policiais durante a cimeira da NATO (apesar de não ter sido resolvido pelo MAI, por incumprimento da entidade adjudicatária - por falta de entrega no prazo acordado), é anulável por violação de normas do procedimento concursal, considerando que o valor do contrato torna obrigatória a existência de um Concurso Público Internacional

Termina pedindo a declaração de anulação do contrato, por violação do procedimento concursal obrigatório e adjudicação por ajuste directo, bem como a condenação ao consequente lançamento de concurso público internacional de aquisição de 2 veículos blindados.

Com a p.i. juntou documentos e arrolou como testemunha a Srª D. Raquel Aiveca.

Foram prestadas no processo as informações oficiais tidas por convenientes.

O demandado, após notificação, para o efeito, apresentou contestação aos factos alegados pelo autor A, deduzindo excepção dilatória pela ineptidão da p.i e ilegitimidade do autor e, por impugnação, a matéria constante nos artºs 7º a 18º da p.i.(cfr fls 13 a 16 dos autos)

Apresentou, ainda, contestação quanto aos factos alegados pelo autor B, deduzindo igualmente excepção dilatória por ineptidão da p.i. e ilegitimidade do autor. Contestou por impugnação os factos alegados nos artºs 11º, 13º a 15º, 22º a 43º, 48º da p.i.(cfr. fls 17 a 20 dos autos)

O tribunal procedeu à inquirição das testemunhas arroladas pelos autores (cfr Acta junta a fls 3 a 17 dos presentes autos).

O Tribunal ordenou a abertura de vista ao Digno Magistrado do MP (cfr despacho exarado a fls 21 a 25 dos autos)

O Digno Magistrado do M.P. junto deste Tribunal, emitiu douto parecer no sentido de se manter o contrato, uma vez que, não obstante existir um vício procedimental, quanto à formação do contrato, será mais lesivo para o erário público a sua anulação e a subsequente abertura de novo procedimento concursal, invocando para o efeito o nº 4 do artº 283 do Código dos Contratos Públicos (CCP).
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FUNDAMENTAÇÃO

Factos Provados

Da discussão da causa resultaram provados os seguintes factos com interesse para a sua decisão:

Foi celebrado entre o MAI e a General Dynamics um contrato de fornecimento de dois veículos blindados;
Os veículos blindados destinavam-se a ser utilizados na Cimeira da Nato, que teve lugar nos dias 19 e 20 de Novembro de 2010 em Lisboa;
O MAI adjudicou a compra através de ajuste directo;
O valor do contrato é de € 1 200 000,00;
A entrega dos veículos ocorreu após a data de realização da Cimeira;
Não se verificou a resolução do contrato;
O MAI manteve interesse em continuar com a compra;
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Factos não provados

Dos factos, com interesse para a decisão da causa, constantes do processo e objecto de análise concreta, não se provaram os constantes nos quesitos 2 a 4.



Motivação da Decisão de Facto

A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, que dos autos constam e nos depoimentos das testemunhas arroladas pelos autores.
No entender deste Tribunal ficou provado, através dos depoimentos produzidos em audiência, bem como das provas documentais apresentadas pelo demandado (cfr anexo aos autos), que existe interesse na manutenção do contrato de aquisição dos veículos.
Atendendo ao princípio da livre apreciação da prova, considera este Tribunal que a resolução deste contrato acarretaria custos manifestamente desproporcionados para o erário público com a eventual indemnização a pagar ao contra-interessado.
Quanto às expectativas invocadas por B, entende este Tribunal que, as mesmas, não ficaram provadas pelo que não há lugar à indemnização pedida.
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Questões que cumpre solucionar

Em face da matéria de facto provada, as questões que importa solucionar prendem-se com a análise dos fundamentos da acção que originou os presentes autos, devendo, igualmente o Tribunal examinar todas as questões, relevantes para a decisão da causa, que sejam de conhecimento oficioso (artº 660, nº 2 do Código do Processo Civil) ou que tenham sido alegadas pelos intervenientes processuais.
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Enquadramento jurídico

Importa agora proceder à subsunção jurídica da matéria de facto provada em ordem a posterior decisão da causa.
Nos termos do nº 1 do artº 283 do CCP “os contratos são nulos se a nulidade do acto procedimental em que tenha assentado a sua celebração tenha sido judicialmente declarada, ou possa ainda sê-lo”.
No entanto, o nº 4 da citada norma refere que a nulidade pode ser afastada quando, ponderados os interesses públicos e privados em causa e a gravidade geradora do vício do acto procedimental, a anulação do contrato se revele desproporcionada ou contrária à boa fé ou quando se demonstre inequivocamente que o vício não implicaria uma modificação subjectiva no contrato celebrado nem uma alteração do seu conteúdo essencial.
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Dispositivo


Face ao exposto, o Tribunal julga IMPROCEDENTES as acções deduzidas por Francisco d’ Esperto (A) e Somos de Inteira Confiança,, Lda (B).

Condenam-se os autores em custas.

Valor do processo para efeito de custas: € 1 200 000,00

Registe
Notifique

Lisboa, 17 de Dezembro de 2010.

Os Juízes de Direito,

Ana Luísa

Arlindo Varela

Bruno Espada

Carla Almeida

Fernando Canuto

José Alexandre

Luciana Ferreira

Manuel Estalagem

Palmira Estalagem

Susana Vital

domingo, 19 de dezembro de 2010

função preventiva ou função reactiva?

“ O peixinho vai nadando, vai nadando de mansinho, ele sobe e dá uma volta e continua o seu caminho”
Com todo o respeito pelo legislador do CPA, é a cantarolar esta música infantil que tento interpretar a letra da lei e o pensamento legislativo expresso no CPTA.
Na nova reforma do Contencioso Administrativo o legislador estabeleceu o regime jurídico dos meios processuais existentes, principal, cautelar e executivo, no ETAF (Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais) e no CPTA (Código do Procedimento nos Tribunais Administrativos). As acções previstas vêm exemplificar as pretensões específicas que podem ser feitas no âmbito da garantia constitucional de “ (…) tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo, nomeadamente, o reconhecimento desses direitos ou interesses, a impugnação de quaisquer actos administrativos que os lesem, independentemente da sua forma, a determinação da prática de actos administrativos legalmente devidos e a adopção de medidas cautelares adequadas.”, Art.º268.º, n.º4 da CRP.
O CPTA regula toda a tramitação jurisdicional, aplicando-se subsidiariamente o CPC (Código do Processo Civil) nas matérias que o art. 35.º do CPTA remete expressamente. Os meios processuais que o CPTA prevê são:
- acção administrativa comum, art. 37.º e SS.
-acção administrativa especial, art.46.º e SS.
-processos urgentes, art.97.º e SS.
-processos cautelares, art.112.º e SS.
-processo executivo, art.157.º e SS.
Cada um pretende tutelar uma pretensão específica (existe ainda a possibilidade de se fazer uma cumulação de pedidos, art.4.º e 5.º CPTA), reunindo os pressupostos, nomeadamente os relativos ao objecto (pedido e causa de pedir), legitimidade (activa e passiva), oportunidade e a competência dos tribunais, permitindo aos interessados ver os efeitos dos seus pedidos nas sentenças, com força de caso julgado.
Contudo, existem pedidos que parecem ser uma mistura de diferentes meios processuais, nomeadamente a acção comum e a acção especial, como o caso do pedido de condenação previsto no art.º37.º, n.º2, al. c) CPTA, chamada de “acção impositiva e acção inibitória” (Vieira de Andrade, e Mário Aroso de Almeida) ou “acção condenatória” (Vasco Pereira da Silva) prevista no art.º37.º, n.º2, al. c) CPTA com a seguinte redacção:“ Condenação á adopção ou abstenção de comportamentos, designadamente a condenação da Administração á não emissão de um acto administrativo, quando seja provável a emissão de um acto lesivo.”
Esta nova subespécie de acção administrativa comum vem ao encontro da evolução do Procedimento Administrativo e o surgimento da Administração Prestadora e Infra-estadual que tem como novos domínios de intervenção, como o ambiente, urbanismo, ordenamento do território, etc. Porque permite condenar a Administração por qualquer comportamento que seja lesivo aos direitos e interesses dos cidadãos.
Este pedido é feito no âmbito da acção comum, forma de processo principal, cuja delimitação é feita na negativa, por exclusão ” (…) nem neste Código nem em legislação avulsa, sejam objecto de regulação especial”. A natureza dos pedidos são variados, de simples apreciação (al. a), b)), pedidos de condenação (al. c), d), e), f), g), e existe combinação de pedidos de simples apreciação, constitutivos e os de condenação al. h), i), j) e o n.º3, art.37.º do CPTA.
Mas a al. c) expressa a possibilidade de se condenar a Administração a adoptar ou a abster-se de determinados comportamentos, como por ex. emitir actos administrativos, que podem ser lesivos. O que levanta a algumas dúvidas, pois corre-se o risco de confundir este meio comum com outro meio processual, o especial que tem como objecto, pedidos relativos á prática ou omissão ilegal de actos administrativos art.º46.º, n.º1 CPTA.
Segundo a doutrina esta norma comporta 2 acções:
1º acção inibitória, que visa impedir a consumação de um comportamento lesivo da Administração;
2ºacção impositiva, que visa obrigar a Administração a adoptar medidas de conteúdo positivo quando sejam adequadas a evitar o risco de lesão na sua esfera jurídica;
a)Que comportamentos podem e devem ser abrangidos neste pedido de condenação?
Mário Aroso de Almeida e Vieira de Andrade adoptam uma noção ampla de comportamentos, que abrange todas as actuações públicas: as técnicas, as informais, as operações material, incluindo os actos administrativos, e os simples actos jurídicos ( ex. abertura de concursos, fixação de prazos, etc.). Apenas divergem na forma de utilização deste pedido, Vieira de Andrade restringe este pedido nas impossibilidades de tutela através da acção especial, e para a defesa de direitos absolutos (direitos, liberdades e garantias, direitos pessoais ou os de propriedade, e os direitos da comunidade no âmbito da acção popular. Mário Aroso de Almeida não restringe aos direitos absolutos, para ele serve para a tutela de qualquer direito ou interesse, desde que se demonstre o interesse processual qualificado, e que esta acção seja o meio idóneo a obter uma sentença que não seria eficazmente obtida através da impugnação de actos na acção especial (que tem uma função reactiva) e nem através de recurso a providências cautelares. Assim o autor tem que convencer o tribunal do seu interesse qualificado, baseado na situação de risco e na possível produção de danos da conduta da Administração, e convencer o tribunal da utilização desta tutela preventiva, que é necessária, mas não é tão urgente que requeira uma tutela cautelar.
O Prof. Vasco Pereira da Silva, embora procure “um sentido útil ” á exemplificação da 2ªparte da norma, “ (…) á não emissão de um acto administrativo (…)”, admite em termos excepcionais esta tutela de actos administrativos na acção comum . Mas deixa a critica de que incluir os actos administrativos na acção comum, é mais uma prova dos “traumas de infância” e das influências (das “sessões de grupo”) do Direito Alemão, porque o sistema germânico é diferente do português. Assim é favorável á ideia de acção preventiva de actos administrativos apenas na acção especial.
Em suma, esta acção inibitória e impositiva, tem uma função preventiva por isso que se distingue da acção especial, impugnação de actos administrativos, que tem uma função reactiva, posterior a emissão do acto. Mas distingue-se da acção cautelar, que também tem um a função preventiva, pois é definitiva e não provisória. E apenas é admissível nos casos de fundado receio de violação dos direitos dos cidadãos, por parte de um futuro comportamento da Administração.
Bibliografia
-Almeida, Mário Aroso de / Cadilha, Carlos “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos” 3ª edição, Almedina, 2010, pag.232 e SS.
-Andrade, Vieira de “ Justiça Administrativa (Lições) ”, 3ªedição, Coimbra, 2000 pag. 185 e SS.
-Silva, Vasco Pereira da “ A acção para o Reconhecimento de direitos” em Cadernos de Justiça nº16, Julho - Agosto 1999 pag. 41 e SS.
- Silva, Vasco Pereira” O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise”, 2ªedição, Almedina, Coimbra, 1998 pag. 449 e SS.


Trabalho realizado por: Carla Varela, nº 15439, 4ºano noite, subturma 1

O peixinho foi nadando e concluiu o seu caminho ;-)

Boas férias e boas festas.

A acção administrativa comum no contencioso administrativo português

No ordenamento jurídico português desde há muito que os processos que tocam não só na responsabilidade civil da Administração mas também em litígios sobre contratos administrativos, são resultantes daquele que ficou conhecido no nosso contencioso administrativo como o contencioso das acções.
Relacionado com questões que não envolviam a fiscalização de manifestações do poder de autoridade da Administração, e que por isso não integravam o núcleo central da jurisdição administrativa, então refém de um meio processual próprio, o recurso contencioso, aquele contencioso era, por isso, conhecido como o contencioso por atribuições. Embora confiada à competência dos tribunais administrativos, sempre se pensou, no mínimo teoricamente, que ela podia ter sido entregue à dos tribunais comuns. Além de que, uma vez caracterizada pela falta de especificidades, a tramitação dentro dos processos não seguia um modelo próprio do contencioso administrativo, antes do processo declarativo comum, naturalmente previsto no Código do Processo Civil.
A realidade é, agora, diferente. Os litígios que integravam o tal contencioso por atribuição são, actual e naturalmente, considerados litígios emergentes de relações jurídico-administrativas, algo cuja apreciação está, segundo a lei das leis portuguesas, a Constituição, atribuída aos tribunais administrativos. Contudo, e dentro das fronteiras da jurisdição administrativa, o próprio CPTA mantém a distinção entre os litígios que atingem a realidade do exercício de poderes de autoridade por parte da administração, apesar ainda e também intimamente ligados à prática ou omissão de acto administrativo ou de normas, e os outros que de todo não se fazem acompanhar daquela primeira característica – o de mesmo que infimamente estarem em conexão com a prática ou a omissão de acto administrativo.
Não podendo ser considerados, por si, como elementos suficientes para constituírem o núcleo duro da jurisdição administrativa, os primeiros daqueles litígios encerram questões e ainda colocam exigências que justificam uma atenção especial, atenção essa que se traduz na existência de uma forma processual exclusiva do contencioso administrativo, a acção administrativa especial, que naturalmente nada mais tem por objectivo do que regular a tramitação daquele tipo de processos. Já os segundos não necessitam desse tipo de proteccionismo no que à sua tramitação concerne e é por essa fundamental razão que o CPTA os confina à acção administrativa comum, forma essa obediente ao disposto no processo declarativo do Código Processo Civil.
A acção administrativa comum encontra correspondência, assim, num meio processual que apesar de poder terminar com sentenças condenatórias, de simples apreciação e constitutivas, acolhe também todos os litígios jurídico-administrativos excluídos pelas especificidades dos restantes meios processuais.
Assim, ao sustentar que com o CPTA certas pretensões seguem a forma da acção administrativa comum, está a dizer-se implicitamente que a tramitação dessas pretensões se rege pela forma de processo declarativa do Código de Processo Civil.
A acção administrativa comum abrange, por isso e primeiro que tudo, o contencioso das acções em matéria da responsabilidade civil extracontratual e em matéria contratual – tal como determinam as alíneas f) e h) do n.º 2 do art.º 37 do CPTA. É por esta razão que parte das disposições particulares do código, no universo restrito da acção administrativa comum, diz respeito a estes processos.
Entre aquelas disposições, merece ser destacado o art.º 40.º que aumenta consideravelmente a legitimidade para fazer valer a invalidade, seja ela total ou parcial, dos contratos celebrados pela Administração Pública e para levantar questões relativas à execução desses contratos muito para lá das partes na relação contratual.
Além das acções de responsabilidade e sobre contratos, a acção administrativa comum é a forma que corresponde a todo e qualquer processo em que se pretenda a condenação da administração ao cumprimento de deveres de prestar que não envolvam a emissão de um acto administrativo impugnável, nem devam ser alvo de um dos dois processos urgentes de intimação que o código prevê nos seus art.ºs 104 e ss.
A acção administrativa comum acolhe ainda acções não nominadas – às quais se referia anteriormente o art.º 73.º da LPTA – e que podem ser, nomeadamente, intentadas por entidades públicas contra outras entidades públicas ou ainda contra particulares. Aliás, o elenco exemplificativo das pretensões passíveis de encontrar abrigo na acção administrativa comum que se encontra no n.º 2 do art.º 37 do CPTA não pretende mais do que clarificar o sentido da fórmula genérica enunciada no n.º 1, esclarecendo os interessados sobre alguns dos principais tipos de pretensões que, individualmente ou em conjunto, podem tentar concretizar através da acção administrativa comum.

Luís Miguel Santos
Aluno n.º 17635

sábado, 18 de dezembro de 2010

Administração: uma parte no processo, ou parte suprema?

Administração: uma parte no processo, ou parte suprema?
O exemplo do art.º 45 CPTA

Verificam-se situações em que realmente a Administração não pode ser considerada como mera parte no processo, sendo antes, uma parte com vantagens e supremacia em relação às outras partes. Pergunta-se: como compatibilizar as prerrogativas da Administração, em nome do interesse público, com a igualdade das partes, plasmado no art.º 6º CPTA, que necessariamente deve decorrer do princípio geral da igualdade?
Se o Contencioso Administrativo fez uma viragem para uma vertente subjectivista, que poderíamos considerar subjacente aos n.ºs 4 e 5 do art.º 268 da CRP, tentando garantir a efectiva tutela dos direitos dos particulares face à Administração, como entender que, em face de um direito reconhecido, se venha a denegá-lo, submerso no mar do interesse público?
Assim, como dizer que há uma completa viragem, desde o contencioso de mera legalidade, centrado no acto administrativo definitivo e executório, até à tutela plena dos direitos dos particulares?
Mais - como dizer que há efectivamente a defesa da legalidade, numa perspectiva igualitária, quando se considera o caso de um acto anulável, cuja anulação foi requerida ao Tribunal, por parte com legitimidade para tal, e o Tribunal julga improcedente a acção, em prol do interesse público?
É o caso previsto, por exemplo, no art.º 45º CPTA: o Tribunal pode verificar que um acto deveria ser anulado, mas não o anula, pelo facto de causar excepcional prejuízo ao Estado. Se por um lado se compreende que o prejuízo causado ao Estado é, em última medida, causado a todos os cidadãos, por outro lado, poderemos estar em presença de um mecanismo que permite a fraude à lei. Vejamos um exemplo: a Administração celebra, por algum motivo, um contrato para aquisição de serviços através de ajuste directo, que poderá não ser a melhor escolha do ponto de vista do interesse público, podendo, enquanto o faz, lesar direitos de particulares; além disso, acrescentemos a hipótese desta celebração ser feita ilegalmente, i.e., não respeitando os requisitos para a escolha do ajuste directo. Se a posteriori o Tribunal não o anula, poderemos dizer então que a última palavra cabe no fundo à Administração, que poderá praticar actos ilegais, que lesam interesses de particulares, e que esses actos se manterão na ordem jurídica, em nome do interesse público… e o interesse público na manutenção da “legalidade material” (e não formal, visto que, neste caso, existem normas que assim o permitem) e na boa administração da justiça?
A sentença proferida na sequência de um pedido deve tutelar os direitos subjectivos (no seu sentido amplo), defender a legalidade e o interesse público na boa administração da justiça. No exemplo atrás referido, parece difícil dizer que esses objectivos foram cumpridos – parecem, ao invés, ter sucumbido em face do interesse público.
O art.º 45º do CPTA - bem como outros já apontados em comentário anterior, como o art.º 120º e o 73/2 do mesmo código, parecem não ser totalmente consistentes com a defesa dos direitos dos particulares, e o caminho que traçam merecerá ser alvo de crítica.
Assim, como se pode ler no Ac. TCAN, proferido no processo 01070/04.1BEBRG:
O “(…) art.º 45º do CPTA, o qual, como apontado já no aludido requerimento da recorrente de 13/07/2005, é um preceito ferido de inconstitucionalidade; (…) E isto porque viola não só o princípio constitucional da separação de poderes, estabelecidos no art.º 111 da CRP; (…) Mas também os princípios processuais da estabilidade da instância, do pedido e da conformação do pedido com a decisão de mérito arts. 268º, 272º, 273, 660, n.º 2 e 661º n.º 1 do CPC, constitucionalizados pelo art. 20º da dita CRP – Cfr. Dr. Vasco Pereira da Silva e Prof. Dr. José Lebre de Freitas, in texto da alegação e notas de rodapé (…)”.
De facto, a norma permite que os Tribunais possam desconsiderar o que está cominado na lei com a sanção da anulabilidade. E mais permite – indirectamente, permite que a Administração faça o mesmo, como no exemplo atrás exposto, ao que nos parece, em violação do princípio de separação de poderes consagrado no art.º 111º da CRP. Assim, em vez de termos um sistema em que directamente julgar era administrar, indirectamente, consegue-se o mesmo resultado.
Pelo que, deste ponto de vista, a constitucionalidade do art.º 45º do CPTA poderá (ou deverá…) ser sindicável junto dos tribunais que a aplicam a um caso concreto, através do mecanismo da fiscalização concreta, nos termos do art.º 204 da CRP.
A reforma do contencioso administrativo que, segundo o Prof. Dr. Vasco Pereira da Silva, foi no sentido da europeização e constitucionalização do Processo Administrativo, parece ainda não ter colmatado todas as deficiências do sistema.
Se se continuar a permitir que em nome do interesse público se convalidem de certo modo actos ilegais, a Administração não será obrigada a caminhar para a auto-responsabilização que seria desejável. De facto, haveria porventura outros mecanismos para atingir o mesmo fim de salvaguarda do interesse público, como seja o mecanismo previsto no art.º 6º do Regime da Responsabilidade Civil extracontratual do Estado e Demais entidades Públicas, i.e., o direito de regresso do Estado contra funcionários. O interesse público é antes de mais, garantir que o Estado não cometa actos ilegais, ainda mais quando lesivos do erário público (como no caso da celebração de contratos usando o procedimento de ajuste directo, fora dos casos permitidos por lei). A ratio subjacente à restritividade com que é admitido este procedimento é precisamente a de garantir o respeito pela concorrência, igualdade e transparência, de que o concurso público dá mais garantias. E não só garante melhor os interesses de particulares que porventura queiram aceder ao concurso, mas também dará maior garantia de conseguir um melhor negócio para o Estado.
O que se pretende com este exemplo é salientar o facto de não ser só o concorrente o lesado – o Estado também - pelo que, indirectamente, também todos os cidadãos.
Nas palavras do Prof. Dr. Vasco Pereira da Silva, “(…) A “dependência da realidade” do Contencioso Administrativo obriga, assim, a prestar uma atenção redobrada à prática, para apreciar o modo como a reforma vai ser interpretada e aplicada pelos “sujeitos” da Justiça Administrativa – magistrados, advogados, juízes, professores universitários, mas também administrações públicas e privados lesados ou simplesmente interessados. Se a nossa época jurídico-administrativa pode ser caracterizada como a “idade das reformas” (Cassese), as quais podem e devem ser apreciadas em razão da bondade e da coerência das opções tomadas pelo legislador (nacional, mas também europeu), todavia, a respectiva eficácia fica grandemente dependente dependente dos operadores jurídicos, que são quem – em última análise – “criam o direito” na sua aplicação”. In Silva, Vasco Pereira da, “O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise”, 2ª ed. Almedina, 2009.
Neste sentido, pergunto-me acerca da bondade da decisão a que se chega – de forma legal, diga-se – quando o juiz declara improcedente o pedido de anulação de um acto anulável, sem que haja qualquer obstáculo a isso, sem ser o interesse público.
Não se quer com isto dizer que o interesse público não deverá pesar na balança, mas que o próprio conceito de interesse público não se deverá limitar a prejuízos eventualmente de ordem meramente económica; A consideração deste conceito como tal (de forme redutora) poderá levar à preterição do interesse público, em nome do… interesse público ele mesmo. Assim, como atrás se disse, existe um interesse público na boa administração da justiça, na auto-responsabilização da Administração e seus funcionários, que deverá estar sempre presente num Estado de Direito. Eventualmente, “moralizando o sistema”, garantir-se-á um melhor “interesse público”.
A aluna,
Isilda Cunha
N.º 17623

Problema de legitimidade a mais?

O princípio basilar da actuação da Administração é o da prossecução do interesse público. É este o princípio motor da Administração pública[1].
A evolução do contencioso administrativo tem vindo a estabelecer uma cada vez maior subjectivização do processo, estabelecendo como critério principal de determinação de legitimidade activa o ser parte na relação material controvertida. Com a subjectivização do contencioso, o particular recorre ao contencioso administrativo para a prossecução do seu interesse particular.
Destas duas simples considerações é possível determinar o conflito de interesses entre o interesse público e privado em causa no contencioso administrativo.
É de acrescentar ainda o nº 2 do art.9º do CPTA que atribui legitimidade activa a “qualquer pessoa… tem legitimidade para propor e intervir, nos termos previstos na lei, em processos principais e cautelares destinados à defesa de valores e bens constitucionalmente protegidos” elencando alguns dos valores constitucionalmente protegidos. No fundo, o interesse em causa não é um interesse particular mas pode ser um interesse difuso, comunitário, colectivo ou até interesses individuais homogéneos[2]. Este aspecto parece vir na linha da distinção constitucional entre "direitos e interesses legítimos" (art. 20º nº 1da CRP) ou entre "direitos e interesses legalmente protegidos" (art. 268º nº 5 da CRP).
No caso das acções populares a problemática deve centrar-se na tensão que pode surgir da confrontação do interesse público da actuação da administração e do interesse público invocado pelo particular no âmbito da acção popular.
Apresentam-se duas questões que se têm por pertinentes neste contexto de evolução do contencioso:
1 - Deve a impugnação judicial da actuação da Administração ceder no caso de se verificar que o resultado da sentença acarreta um custo superior ao benefício resultante da reposição do direito subjectivo?
2 - Devem os custos do recurso ao processo judicial de impugnação de uma actuação incluir o custo de oportunidade de o tribunal ser ocupado com uma questão que poderá não ter um efeito útil ou considerar a legitimidade de tal forma abrangente que permita a qualquer pessoa recorrer ao contencioso invocando uma interpretação abrangente dos princípios constitucionais a proteger pelas acções populares?
A resposta a estas questões depende da análise de duas problemáticas fundamentais, a questão de o interesse público poder prevalecer sobre o interesse particular e a segunda de saber se o alargamento da legitimidade pode colocar em causa o direito fundamental do acesso à justiça em tempo útil.
O princípio Constitucional da tutela jurisdicional  efectiva previsto no art. 20.º da Constituição da República Portuguesa nas suas vertentes do acesso ao direito e aos tribunais e na sua vertente do direito a obter uma decisão judicial em prazo razoável deve ser o escopo de um Contencioso Administrativo orientado para a utilidade das decisões judiciais.

A questão da utilidade do processo e a utilidade da actuação da administração devem ser vectores chave para um Estado eficiente. O alargamento do objecto do processo e a subjectivizaçãoatribui ao particular prorrogativas que permitem ser utilizadas no sentido da colaboração ou da mera entropia do sistema de decisão e acção da Administração mas no limite poderão haver cerca de dez milhões de potenciais autores para cada situação. Para estabelecer este controlo de acesso de utilização da acção popular estabeleceu-se que esta poderia ter lugar no âmbito da defesa de valores e bens constitucionalmente protegidos.
A legitimidade activa para o controlo do exercício da Administração tem de estar directamente relacionada com a ideia de justiça e de conveniência das actuações da própria Administração mas para que o processo seja adequado ao fim a que se destina e não se pode configurar como um mero expediente dilatório da actuação da Administração.
O CPTA criou as condições do alargamento do processo para garantir a possibilidade de os particulares obterem uma verdadeira e efectiva garantia dos seus direitos violados pela Administração bem como, da possibilidade de os particulares recorrerem à justiça não no âmbito de um interesse próprio mas num interesse geral da comunidade, mas cabe especialmente à Jurisprudência a utilização do processo com o objectivo de que ele seja útil e um verdadeiro garante dos direitos violados pela Administração.
Neste âmbito, também a doutrina terá um papel relevante na concretização do modelo actualmente em vigor e no fornecimento de elementos que ajudem a utilizar de forma adequada os valiosos recursos que a recente reforma do contencioso administrativo acrescentou à nossa ordem jurídica.
Não podemos correr o risco de ter evoluído de um sistema arcaico do mero controlo da legalidade do acto para um sistema altamente garantístico que resulte num completo entupimento dos tribunais com acções sem a mínima utilidade. A chave deste equilíbrio está na legitimidade activa no e na sua definição pela utilidade da decisão.

Bibliografia:
 SILVA, Vasco Pereira da (2009); O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, 2ª edição; Almedina;
AMARAL, Diogo Freitas do (2001); Curso de Direito Administrativo, volume II, 2ª edição; Almedina;
 ANDRADE, José Carlos Vieira de (2007); Justiça Administrativa, 9ª edição; Coimbra Editora


[1] Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, vol. II, p33
[2] Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa, 10ª edição, p177

Nuno Mira Rodrigues
ST1
Aluno N.º 17697

O Vislumbre da Reforma Administrativa Angolana

O primeiro vislumbre da reforma administrativa Angolana ocorreu no ano de 1990 com a aprovação da Lei nº 17/90, à qual se seguiu uma ' explosão legislativa ' , entre 1991 e 1994.
No entanto, o primeiro programa de reforma foi aprovado apenas no ano 2000, o que demonstra as dificuldades no percurso para a modernização administrativa Angolana, sem contudo esta deixar de ser vista como uma prioridade, como o próprio Programa de Reforma Administrativa refere " (...) as reformas institucionais prefiguram-se como das mais importantes nesta fase de transição para a economia de mercado, no preciso sentido de preparar a Administração do Estado para o exercício correcto da política (...)"
A Lei nº 17/90 cumpriu também a árdua tarefa de diferenciação do sector público administrativo e do sector privado, pois até esta, todos os trabalhadores estavam sujeitos ao regime da lei geral do trabalho e perante um processo de evolução em curso esta era uma tarefa inadiável.
É possível afirmar que a ' explosão legislativa ' em muito irá continuar a contribuir para a evolução Administrativa Angolana, no entanto, parece que a maior dificuldade será mesmo ao nível dos recursos humanos, pois quer os funcionários, quer os respectivos serviços são ainda pouco especializados o que leva na prática a uma certa resistência dos serviços, em geral, a respeitar a legislação actual.
Contudo, a Constituição enquanto Lei Suprema e Fundamental da República de Angola, veio alterar o sistema político-administrativo, no entender do Professor Cremildo Paca, docente da Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto, será no seu seguimento que irá ser desenvolvido o novo ordenamento jurídico Angolano.
Espera-se que também os tribunais, os juízes e todos os serviços sejam alargados, para que a resposta em relação a esta matéria seja concretizada com a maior brevidade e sucesso.


Cátia Branco Oliveira
Aluna nº 17234

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

TRAMITAÇÃO EM CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO

Nas acções administrativas comuns e administrativas especiais existem diferenças de características e de valor que implicam que os procedimentos a adoptar no desenrolar do processo sejam, necessariamente, diferentes.
Aos casos previstos no Titulo II do CPTA (art.º 37º e ss) corresponde o processo de declaração regulado pelo CPC nas formas, ordinária, sumária e sumaríssima.
Os casos previstos nos Títulos III e IV do CPTA (art.º 46º e seguintes e 97º e seguintes), regem-se pelas disposições aí previstas e pelas disposições gerais, sendo subsidiariamente aplicável o disposto na lei processual civil, correspondendo as seguintes formas de processo:
Acção Administrativa especial; Contencioso eleitoral; Intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões; Intimação para protecção de direitos liberdades e garantias.
Embora a tradição do nosso contencioso administrativo seja a de remeter, no contencioso das acções sobre contratos e responsabilidade, para o processo civil de declaração na forma ordinária, a remissão, passa, contudo, a ser feita também para a forma sumária e para a forma sumaríssima, em função do valor da causa.
O processo começa pela apresentação na secretaria do Tribunal competente, em regra por advogado, de uma petição inicial, a qual pode ser entregue na secretaria judicial (art.º 150º, nº1 alínea b) do CPC), por telecópia (art.º 150º nº1, alínea c) do CPC e DL. Nº 28/92, de 21/02), correio electrónico, com aposição de assinatura electrónica avançada, sendo a data de expedição a que demarca o inicio da instância (art.º 267º, nº 1 do CPC) e envio através de outro meio de transmissão electrónica de dados (art.º 150º, nº 1 alínea e) do CPC).
A secretaria que receber a petição terá que verificar se estão observados os requisitos do disposto no art.º 467º do CPC, ou seja, a designação do Tribunal onde a acção é proposta e identificação das partes, nomes, domicílios e, sempre que possível, profissões e locais de trabalho; a indicação do domicilio profissional do mandatário judicial; indicação da forma de processo; exposição dos factos e das razões de direito que servem de fundamento à acção; a formulação do pedido bem como a declaração do valor da causa.
Caso a secretaria judicial recuse o recebimento da p.i. deverá indicar por escrito, o fundamento da rejeição, do qual cabe reclamação para o juiz, podendo ser interposto recurso de agravo do despacho que confirmar ou não o recebimento (art.º 475º do CPC), à parte é facultada a possibilidade de entrega de nova petição ou de documentos em falta dentro dos 10 dias seguintes à recusa de recebimento ou à notificação da decisão judicial que a tenha confirmado (art.º 476º do CPC).
Seguem a forma de acção administrativa comum os processos que tenham por objecto litígios cuja apreciação se inscreva no âmbito da jurisdição administrativa e que, nem no CPTA, nem na legislação avulsa, sejam objecto de regulação especial (nº1).
Seguem designadamente a forma de acção administrativa comum os processos que tenham por objecto litígios relativos a (nº2), Reconhecimento de situações jurídicas subjectivas directamente decorrentes de normas jurídico-administrativas ou actos jurídicos praticados ao abrigo de disposições de direito administrativo; de Reconhecimento de qualidades ou do preenchimento de condições; as de Condenação à adopção ou abstenção de comportamentos, designadamente a condenação da administração à não emissão de um acto administrativo, quando seja provável a emissão de acto lesivo; Condenação da Administração à adopção das condutas necessárias ao restabelecimento de direitos ou interesses violados; Condenação da Administração ao cumprimento de deveres de prestar que directamente decorram de normas jurídico-administrativas e não envolvam a emissão de um acto administrativo impugnável, ou que tenham sido construídos por actos jurídicos praticados ao abrigo de disposições de direito administrativo, e que podem ter por objecto o pagamento de uma quantia, a entrega de uma coisa ou a prestação de um facto; as de Responsabilidade Civil das pessoas colectivas, bem como dos titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, incluindo acções de regresso; as de Condenação ao pagamento de indemnizações decorrentes da imposição de sacrifícios por razões de interesse público; as de Interpretação, validade ou execução de contratos; as de Enriquecimento sem causa, assim como as provenientes de Relações Jurídicas entre entidades administrativas.
Quando, sem fundamento em acto administrativo impugnável, particulares, nomeadamente concessionários, violem normas de direito administrativo ou vínculos jurídico-administrativos contratualmente assumidos, ou haja fundamento receio de que os possam violar, sempre que solicitadas a faze-lo, as autoridades competentes tenham adoptado as medidas adequadas, qualquer pessoa ou entidade cujos direitos ou interesses sejam directamente ofendidos pode pedir ao Tribunal que condene os mesmos a adoptarem ou a absterem-se de certo comportamento, por forma a assegurar o cumprimento das normas em causa.
A tramitação que se entendeu qualificar como “especial”, por contraposição à tramitação comum, por obedecer a um modelo especifico, próprio do contencioso administrativo, e que, embora com diversas adaptações que o aproximam da forma de processo “comum”, resulta da fusão das duas formas de tramitação do recurso contencioso de anulação que se encontravam previstos nas alíneas a) e b) do art.º 24º da LPTA revogada.
A acção administrativa especial caracteriza-se pelo facto de se reportar à prática ou omissão de actos administrativos ou de normas.
Os prazos de impugnação vêm previstos no art.º 58º do CPTA e tem lugar no prazo de 1 ano, se promovido pelo Ministério Publico e de 3 meses nos restantes casos.
À contagem dos prazos para a propositura da acção, aplicam-se as regras do art.º 144º, nº 1,2,3 e 4 do CPC (cf. art.º 58º, nº3 do CPTA), contando-se de forma continua, suspendendo-se, durante as férias judiciais, salvo se a duração for igual ou superior a seis meses, o que acontece com o prazo do Ministério Publico ou nos casos previstos no nº4 do art.º 58º do CPTA.
O processo é apresentado na secretaria do tribunal competente de uma petição inicial de acordo tal como de forma comum o que dispõe o art.º 150º nº1 do CPC.
Incumbe à secretaria promover de forma oficiosa e em simultâneo as diligências destinadas à citação sem necessidade de despacho prévio (art.º 81º do CPTA) da entidade pública demandada e dos contra-interessados, para contestarem em 30 dias
Quando por erro cometido na petição inicial, seja citado um órgão diferente daquele que praticou ou devia ter praticado o acto, o órgão citado deve dar imediato conhecimento àquele que o deveria ter sido (nº2), neste caso a entidade demandada beneficia de um prazo suplementar de 15 dias para apresentar a contestação e enviar processo administrativo (nº3)
Quando os contra-interessados sejam em numero superior a 20 (art.º 82º CPTA), o tribunal pode determinar que a respectiva citação seja feita mediante publicação de anuncio, com a advertência de que os interessados dispõem do prazo de 15 dias para se constituírem como contra-interessados no processo, expirado este prazo de 15 dias, os contra-interessados consideram-se citados, devendo contestar, querendo, no prazo de 30 dias.
O Ministério público continua a exercer a acção pública nos termos de sempre, podendo, também assumir a posição de autor, requerendo o seguimento do processo que, por decisão ainda não transitada, tenha terminado por desistência ou outra circunstância própria do autor. Mas é eliminada a vista final que sempre foi praticada quando esteve em vigor a LPTA, bem como a possibilidade de estar presente nas sessões de julgamento (art.º 62º CPTA).
No momento da citação da entidade demandada e dos contra-interessados, é fornecida cópia da petição e dos documentos que a instruem ao Ministério Publico, salvo nos processos em que ele figure como Autor.
Os poderes de intervenção do Ministério Publico podem ser exercidos até 10 dias após a notificação da junção aos autos do processo administrativo ou, não havendo lugar a esta, da apresentação das contestações.
Para o caso de intervenção do MºPº nos termos previstos, serão as partes notificadas dessa mesma intervenção, com cópias (cfr.parte final do nº5 da disposição legal citada.).
Findos os articulados, com a junção da contestação da entidade publica demandada, das contestações dos contra-interessados se os houver, e apensado o processo administrativo, a secretaria dá cumprimento oficioso ao disposto nos artigos 84º, nº6 do CPTA e art.º 526º do CPC, com notificação ao autor da apensação do processo instrutor bem como dos documentos juntos com a contestação, aproveitando-se para enviar as cópias das contestações apresentadas (art.º 152º, nº2 ultima parte do CPC, ficando os autos a aguardar por 10 dias que o Autor venha requerer o que tiver por conveniente.
As partes podem apresentar articulado superveniente, até à fase de alegações, ou quando o articulado se funde na junção ao processo de elementos até aí desconhecidos ou aos quais não tinha sido possível o acesso no prazo de 10 dias posteriores à notificação da junção dos referidos elementos.
Recebido o articulado superveniente, são as partes notificadas pela secretaria para responder no prazo de 10 dias (art.º 86º nº4).
Consagra-se o dever de o juiz proferir despacho de suprimento de excepções dilatórias e aperfeiçoamento dos articulados, dirigido a promover a prossecução da causa e o julgamento de mérito. Ainda a previsão da possibilidade de proferir despacho saneador, em que se impõe ao juiz o dever de conhecer de qualquer questão prévia, cuja apreciação deixa de poder ter lugar em momento ulterior e, portanto, de poder ser remetida para decisão final; mas em que o tribunal também pode conhecer, total ou parcialmente, do mérito da causa, bem como ordenar a abertura de um período de produção de prova.
Findos os articulados, ou o prazo para a sua apresentação, supridas as excepções dilatórias e aperfeiçoados os articulados se for caso disso (art.º 88º CPTA) vai o processo concluso ao juiz, o qual profere despacho quando deva conhecer obrigatoriamente, ouvindo o autor em 10 dias, de todas as questões que obstem ao conhecimento do processo; conhecer total ou parcialmente do mérito da causa e ainda quando entende ser de ordenar a abertura de um período de produção de prova. (art.º 87º do CPTA)
No caso de não poder conhecer do mérito da causa no despacho saneador, o juiz relator pode ordenar as diligências de prova que considere necessárias para o apuramento da verdade.
São admitidos em qualquer processo do contencioso administrativo todos os meios de prova que são admitidos na jurisdição comum, podendo no entanto o juiz indeferir, mediante despacho fundamentado, requerimentos dirigidos à produção de prova sobre certos factos ou recusar a utilização de certos meios de prova, quando tal se afigure claramente desnecessário. (art.º 90 CPTA)
O art.º 91º do CPTA introduziu a possibilidade de existir uma audiência pública para o debate oral sobre a matéria de facto e de direito, quando requerida pelas partes ou determinada pelo juiz.
Assim, finda a produção de prova, quando esta tenha lugar, pode o juiz ou relator, sempre que a complexidade da matéria o justifique, ordenar oficiosamente a realização de uma audiência pública destinada à discussão oral da matéria de facto.
A audiência pública pode também ter lugar a requerimento de qualquer das partes, podendo no entanto o juiz recusar a sua realização, mediante despacho fundamentado, quando entenda que ela não se justifica por a matéria de facto, documentalmente fixada, não ser controvertida.
Caso a audiência pública se realize por iniciativa das partes, nela são também deduzidas, por forma oral, as alegações sobre a matéria de direito.
O nº 4 do art.º 91º do CPTA dispõe que são facultativas as alegações.
Quando a audiência pública não tenha lugar por iniciativa das partes e estas não tenham renunciado à apresentação de alegações escritas nos termos do nº 4 do art.º 78º do CPTA, são notificados o autor, pelo prazo de 20 dias e depois simultaneamente, a entidade demandada e os contra-interessados, por igual prazo, para querendo as apresentar.
O Juiz deve providenciar pela marcação das datas de diligências mediante prévio acordam com os mandatários judiciais que devam comparecer (art.º 155º do CC), para o que pode encarregar a secretaria de realizar de forma expedida os contactos prévios necessários.
Quando a marcação não possa ser feita com prévio acordo dos mandatários judiciais, devem estes, se impedidos noutro serviço judicial já marcado, comunicar o facto ao tribunal, no prazo de 5 dias, propondo datas alternativas, datas estas que deverão ser sugeridas após contacto com os restantes mandatários interessados.
Por forma a favorecer a qualidade das decisões dos tribunais administrativos e Fiscais e alguma uniformidade na resolução de diferentes processos sobre a mesma matéria, permite-se que, sempre que a apreciação de um tribunal administrativo e fiscal se coloque uma questão de direito nova, que suscite dificuldades serias e possa vir a ser suscitada noutros litígios, o respectivo presidente determine que o julgamento se processe com a intervenção que todos os juízes do tribunal e que possa pedir ao Supremo Tribunal Administrativo, no âmbito de um reenvio prejudicial, que este indique o sentido em que a questão deve ser decidida.
Ocorrendo o julgamento com a intervenção de todos os juízes, sendo o quórum de dois terços, o relator determina a extracção de cópia das peças processuais que relevem, as quais são entregues a cada um dos juízes que devam intervir no julgamento, permanecendo o processo depositado na secretaria, para consulta.
DO ACTO À LESÃO


No ancião regime o recurso contencioso era um recurso de anulação sendo o seu fundamento a ilegalidade do acto recorrido, desde que fosse externo, definitivo e executório considerando-se que antes deste a Administração “ainda não disse a sua última palavra”, cf. M. Caetano, Manual de Direito Administrativo, Volume II, pag. 1332.
A legitimidade para recorrer era reconhecida ao titular de interesse directo, pessoal e legitimo no provimento do recurso, numa forma menos ampla, na anulação do acto administrativo susceptível de recurso, o interessado tinha de demonstrar que da procedência do seu pedido resultava uma utilidade ou vantagem. O interesse era directo, quando o provimento implique a anulação ou a declaração de nulidade do acto jurídico que constitua obstáculo à pretensão anteriormente formulada, pessoal, quando recorrente alegue esperar uma utilidade concreta para si próprio ou para a sua função, cuja esfera jurídica se vá produzir os efeitos da declaração pretendida, legitimo se a utilidade proveniente do provimento do recurso não for reprovada pela ordem jurídica.
Os particulares defrontavam diversos obstáculos, a posição dominante da administração e um formalismo excessivo e desrazoável do recurso, conforme considera José Andrade em Justiça Administrativa (lições), pag. 34, “condições de recorribilidade armadilhadas”, (quanto à identificação do acto recorrível, nem sempre fácil de fazer, ou quanto à sua qualidade de acto “definitivo “ e “executório”).
Só com a reforma constitucional de 1982, pela alteração do original art.º 269º actual art.º 268º, se consagrou a intensificação da protecção dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, apontando na subjectivização do modelo de contencioso administrativo, sobretudo por reconhecer acção de reconhecimentos desses direitos, equilibrando a posição dos cidadãos perante os órgãos administrativos, deixa de ser um processo de actos para ser um processo de partes, tutelando-se dessa forma a garantia constitucional de acesso à justiça administrativa como direito fundamental dos administrados a uma protecção jurisdicional efectiva.
O legislador quis tornar inequívoco que o processo é de partes superando os “traumas de infância “da doutrina do “processo ao actos” Vasco Silva, Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, passando do objectivismo clássico ao subjectivismo, os particulares encontram-se em igualdade de armas perante a administração em juízo, não será um forma altruísta de assegurar a legalidade mas uma defesa dos seus direitos subjectivos.

Bibliografia:
M. Caetano, Manual de Direito Administrativo, Volume II.
José Andrade, Justiça Administrativa (lições)
Vasco Silva, Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise.
Aluno nº 17475, Alexandre Ferreira.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Relativamente à matéria da DECLARAÇÃO DE ILEGALIDADE POR OMISSÃO versada em aula teórica aqui fica um acórdão do Supremo Tribunal Administrativo. É aqui tratada a omissão do dever de regulamentar; é também suscitada a legitimidade activa dos autores (ou seja, debate-se se o art.º 77/1, CPTA traz/inculca algo de novo ao conceito do art.º 9/1, CPTA, ou não). Todavia o mais relevante do acórdão, é, penso eu, a discussão em torno do conceito de prejuízo directo plasmado no art.º 77/1, CPTA.

Data do Acordão: 11-03-2010

Sumário: I - A referência a quem "alegue um prejuízo directamente resultante da situação de omissão", constante do nº 1 do art. 77º do CPTA, deve entender-se como reportada à invocação de um interesse individual, que pode consistir numa posição jurídica substantiva ou num mero interesse de facto, devendo, em qualquer caso, tratar-se de um direito subjectivo ou de interesse de facto que derive directamente da norma, ou que seja por ela reconhecido, e que careça de regulamentação para se tornar exequível.
II - A esta luz, o prejuízo a que alude o preceito em causa reconduz-se à ofensa desse direito subjectivo ou interesse de facto, conferido ou reconhecido pela norma legal, ofensa essa consubstanciada na omissão ilegal da regulamentação que era necessária à sua exequibilidade.
III - Ao não publicar a portaria de regulamentação prevista no nº 6 do art. 195º do EMGNR, a Administração está, sem mais, e com essa omissão ilegal, a impedir os Autores, detentores de formação superior como Licenciados, de usufruírem do seu direito subjectivo, reconhecido na citada norma legal estatutária, de ingresso na categoria de oficial dos quadros da GNR, após a frequência de tirocínio de formação com aproveitamento, e no âmbito do preenchimento regular das vagas nos respectivos quadros, desfrutando consequentemente de todas as regalias inerentes a esse ingresso.
IV - A isso se reconduz, in casu, o prejuízo directamente resultante da situação de omissão, a que alude o art. 77º, nº 1 do CPTA, pelo que os Autores têm legitimidade para a acção administrativa especial de declaração de ilegalidade por omissão de regulamentação, prevista neste preceito legal.

Nº Convencional: JSTA00066340
Nº do Documento: SA1201003110819
Data de Entrada: 10-11-2008
Recorrente: A... E OUTROS
Recorrido 1: MFIN E DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Votação: UNANIMIDADE


Meio Processual: REC JURISDICIONAL.
Objecto: AC TCASUL DE 2008/05/15.
Decisão: PROVIDO.
Área Temática 1: DIR ADM CONT - ACÇÃO ADM ESPECIAL.
Legislação Nacional: CPTA02 ART77 ART9.
CONST76 ART268 ART283.
EMGNR93 ART195 ART213.
DL 15/2002 DE 2002/01/29 ART2.
Referência a Doutrina: AROSO DE ALMEIDA O NOVO REGIME DO PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS 2ED PAG227.
VIEIRA DE ANDRADE JUSTIÇA ADMINISTRATIVA LIÇÕES 8ED PAG253.
AROSO DE ALMEIDA E OUTRO COMENTÁRIO AO CÓDIGO DE PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS 2ED PAG453.

Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
(Relatório)
I. A…, B…, C…, D…, E… e F…, todos militares da GNR, identificados na petição de fls. 3, intentaram no TAF de Almada, contra o MINISTÉRIO DAS FINANÇAS E DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA e o MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA, acção administrativa especial de declaração de ilegalidade por omissão da regulamentação prevista no nº 6 do art. 195º do Estatuto dos Militares da GNR, aprovado pelo DL nº 265/93, de 31 de Julho, na redacção que lhe foi dada pelo DL nº 15/2002, de 29 de Janeiro.
Alegaram, em suma, que são militares da GNR com cursos superiores, e que o Estatuto dos Militares da GNR prevê, nos seus arts. 192º, 195º e 213º, a possibilidade de os sargentos e praças com formação superior ascenderem à categoria de oficiais, possibilidade que depende de tirocínio e de quadro a aprovar por Portaria das entidades ministeriais demandadas, regulamentação que não foi efectuada apesar de a referida norma estar em vigor há mais de 10 anos, pelo que pediram que as entidades demandadas fossem condenadas a aprovar a regulamentação prevista no nº 6 do art. 195º do citado Estatuto dos Militares da GNR.
Por sentença daquele Tribunal, de 25.01.2006 (fls. 161 e segs.), foi julgada procedente a excepção da ilegitimidade dos Autores, com base no disposto no art. 77º, nº 1 do CPTA, e, em consequência, absolvidos os Réus da instância.
Esta decisão veio a ser confirmada por Acórdão do TCA Sul de 15.05.2008 (fls. 236 e segs.).
Não se conformando com este acórdão, dele vem interposto pelos Autores o presente recurso de revista, nos termos do art. 150º do CPTA, em cuja alegação formulam as seguintes conclusões:
A- Os ora recorrentes têm prejuízo directo com a ausência de regulamentação da norma do Estatuto do Militar da GNR que prevê a possibilidade de os militares licenciados que frequentarem um tirocínio (curso) integrarem a classe dos oficiais.
B- A interpretação sobre o que se deve entender por "...prejuízo directamente resultante da situação de omissão..." baseia-se em doutrina e jurisprudência antiga e contemporânea do advento do Código Administrativo (1940) e do Regulamento do Supremo Tribunal Administrativo (1957), não atendendo aos objectivos do nosso legislador ao consagrar as acções administrativas especiais de declaração de ilegalidade por omissão de regulamentação.
C- A interpretação do Tribunal recorrido sobre o que se deve entender por "...prejuízo directamente resultante da situação de omissão..." torna praticamente impossível o recurso pelos cidadãos a este tipo de garantia pois a inexistência de uma norma regulamentar não é susceptível de por si só causar prejuízo.
D- A decisão recorrida infringe a tutela jurisdicional efectiva dos direitos ou interesses legalmente protegidos consagrada nos n.ºs 4 e 5 do artigo 268.º da Constituição.
II. Contra-alegou o Ministério da Administração Interna, concluindo do seguinte modo:
I. O recurso de revista deve ser rejeitado por não se encontrarem preenchidos os pressupostos do n.º 1 do artigo 150.º do CPTA, já que não está em causa a apreciação de qualquer questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou que a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito;
II. Caso seja diverso o entendimento desse Venerando Tribunal, certo é que o Acórdão de 15 de Maio de 2008, do Tribunal Central Administrativo Sul (2.º Juízo - 1.ª Secção, Contencioso Administrativo), foi proferido em plena conformidade à lei;
III. Não se verifica o pressuposto para a declaração de ilegalidade por omissão, a que se refere o n.º 1 do artigo 77.º do CPTA: um prejuízo directamente resultante da situação de omissão;
IV. O ingresso na carreira de oficiais, por militares licenciados, obedece ao disposto nos artigos 195.º e 213.º do Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana (EM/GNR);
V. Da falta da regulamentação prevista no n.º 6 do artigo 195.º do EM/GNR não resulta um prejuízo directo para os Recorrentes, já que a aprovação dos quadros de pessoal em causa não determina directamente o ingresso na carreira de oficiais.
III. Contra-alegou igualmente o Ministério das Finanças e da Administração Pública, nos termos de fls. 307 e segs., sustentando, em suma, a falta de pressupostos de admissão do recurso, por entender que não está em causa uma “questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental”, ou que a admissão do recurso “seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”, e, para a hipótese de assim se não entender, que não há qualquer prejuízo para os Autores “directamente resultante da omissão”, ou seja, da ausência da regulamentação prevista no nº 6 do art. 195º do EMGNR. *
O presente recurso de revista foi admitido pelo acórdão de fls. 321 e segs., proferido pela formação prevista no nº 5 do art. 150º do CPTA.
Os Exmos Adjuntos tiveram vista dos autos.
(Fundamentação)
OS FACTOS
O acórdão recorrido considerou assentes, com interesse para a decisão, os seguintes factos:
A - Em 2004-08-27, o Instituto de Contabilidade e Administração de Lisboa emitiu certidão da qual consta que A… "... concluiu o 2º Ciclo do Curso Bietápico da Licenciatura em Contabilidade e Administração – Ramo: Administração Pública, o qual confere o grau de Licenciado...”, cfr. fls. 34 e 35 dos autos.
B - Em 2001-06-20, a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, emitiu certificado, do qual consta que B…"... concluiu a 1 de Junho de 2001 a Licenciatura em Ramo de Formação Educacional em História (...)", cfr. fls. 36 e 37 dos autos.
C - A Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa certificou que B… concluiu a Licenciatura em História em 1997-07-30, cfr. fls. 38 a 40 dos autos.
D - Em 2001-10-03, a Universidade Moderna emitiu certificado, do qual consta que C… concluiu a Licenciatura em Direito em 2001-09-18, cfr. fls. 41 e 41 vrs dos autos.
E - Em 2000-09-01, a Universidade Moderna emitiu certificado, do qual consta que D… concluiu a Licenciatura em Direito em 2000-09-01, cfr. fls. 42 e 42 vrs dos autos.
F - Em 2001-03-22, o Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa emitiu certificado, do qual consta que E… concluiu a Licenciatura em Antropologia, em 1999-12-15, cfr. fls. 43 dos autos.
G - Em 2001-11-23, a Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias emitiu certificado, do qual consta que E… concluiu o Curso de Pós-Graduação em Criminologia, no ano lectivo de 2000/2001, cfr. fls. 44 dos autos.
H - Em 1996-01-09, a CEUL – Cooperativa de Ensino Universidade Lusíada, CRL, emitiu certificado, do qual consta que F…concluiu a Licenciatura em História, em 1995-12-31, cfr. fls. 45 e 46 dos autos.
I - Em 2003-10-20, a Universidade Autónoma de Lisboa emitiu certificado, do qual consta que, F… concluiu o Curso de Especialização em Ciências Documentais, variante de Arquivo, no ano lectivo de 2001/2002, cfr. fls. 47 e 48 dos autos.
J - Em 2003-12-22, D… apresentou requerimento dirigido ao Tenente-General Comandante Geral da Guarda Nacional Republicana, com o seguinte teor:
EX.MO SENHOR TENENTE-GENERAL COMANDANTE GERAL DA GUARDA NACIONAL REPUBLICANA
REQUERIMENTO
D…o, 1.º Sargento de Infantaria, da Brigada Territorial n.º 3, colocado no Posto Territorial de Vendas Novas, Licenciado em Direito pela Universidade Moderna, vem requerer a V. Ex.ª se digne permitir a frequência do tirocínio para o ingresso na carreira de oficiais da Guarda e no respectivo Quadro Jurídico, nos termos e com os fundamentos seguintes:

Dispõe a alínea a) do n.º 2 do Art.º 51º do EMGNR aprovado pelo Decreto Lei n.º 265/93, de 31 de Julho, que são condições exigidas para o ingresso na carreira de oficiais "uma licenciatura ou formação militar e técnica equiparada a bacharelato".

Prevê ainda o Art.º 192º do mesmo estatuto um quadro de Juristas ou Técnico Superior de Apoio, a ser preenchido exclusivamente pelos postos de oficiais.

Porém, resulta do disposto do Art.º 213º, conjugado com o Art.º 217°, ambos do normativo citado, que o recrutamento para oficiais dos quadros da Guarda, "é feito entre alunos que frequentaram os cursos de formação de oficiais dos quadros e, no caso dos licenciados que pertençam aos quadros da Guarda, mediante a frequência do respectivo tirocínio de formação com aproveitamento".

É condição especial de promoção ao posto de Alferes, para os licenciados admitidos por concurso, o tirocínio, Art.º 200º do EMGNR.

Contudo, o requerente supõe reunir as condições gerais de admissão ao referido tirocínio previsto no Art.º 214º do EMGNR, bastando para tal que seja aberto o respectivo concurso para o preenchimento de eventuais vagas no Quadro Jurídico, conforme decorre da alínea f) do n.º 1 da mesma norma.

Atendendo aos vários Princípios consignados no Art.º 47º do EMGNR, o requerente considera que os conhecimentos adquiridos nesta área são de relevante interesse para a Guarda, face à especificidade da Missão, ora alegada à investigação criminal.

Por conseguinte, preenchidas as condições gerais de promoção exigidas pelo Art.º 116.º do EMGNR, vem o requerente, nos termos e com os fundamentos expostos, solicitar a V.ª Ex.ª que seja admitido a frequentar um próximo tirocínio com vista ao ingresso na carreira de oficiais da Guarda e à subsequente integração no respectivo quadro..., cfr. fls. 49 a 50 dos autos.
L - Em 2004-11-17, o Ministro da Administração Interna rejeitou o recurso de C… e de F…, nos termos da informação n° 622- LM/2004, cfr. fls. 78 a 84 dos autos.
M - Em 2004-11-17, o Ministro da Administração Interna rejeitou o recurso de D…, nos termos da informação n° 626-LM/2004, cfr. fls. 104 a 108 dos autos.
N - Em 2004-12-02, D… foi notificado do despacho de 2004-11-17, cfr. fls. 80 dos autos.
O - Em 2004-12-08, C… foi notificado do despacho de 2004-11-17, cfr. fls. 80 dos autos.
P - Em 2004-12-02, F… foi notificado do despacho de 2004-11-17, cfr. fls. 88 dos autos.
Q - Em 2004-11-22, o Ministro da Administração Interna rejeitou o recurso de A… e de E…, nos termos da Informação nº 623-LM/2004, cfr. fls. 91 a 95 dos autos.
R - Em 2004-12-03, A… foi notificado do despacho de 2004-11-22, cfr. fls. 98 dos autos.
S - Em 2004-12-13, E… foi notificado do despacho de 24-11-22, cfr. fls. 100 dos autos.
T - Em 2005-05-11 deu entrada no TAF de Almada, a presente Acção Administrativa Especial, cfr. p.i. de fls. 2 e ss., e 15 a 26 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida (...).
O DIREITO
O acórdão sob revista confirmou a sentença do TAF de Almada que, no âmbito da acção administrativa especial para declaração de ilegalidade por omissão da regulamentação prevista no nº 6 do art. 195º do Estatuto dos Militares da GNR, intentada pelos ora recorrentes contra o Ministério das Finanças e da Administração Pública e o Ministério da Administração Interna, julgou procedente a excepção da ilegitimidade dos Autores, considerando prejudicado o conhecimento das demais excepções, e, em consequência, absolveu os Réus da instância.
O acórdão que admitiu o presente recurso de revista enunciou os fundamentos dessa decisão nos seguintes moldes:
“(...) o TAF de Sintra, na sua decisão, de 25-01-06, viria a absolver da instância os RR., com base na ilegitimidade dos AA, aqui Recorrentes, nos termos no nº 1, do artigo 77º do CPTA, já que, em síntese, a falta da norma que os AA pretendiam ver suprida não lhes provocaria uma prejuízo directo para a sua esfera jurídica, uma vez que existiriam “mais pressupostos aleatórios de que dependerá o objectivo dos AA.”, como seja, o processo de recrutamento e a existência de lugar em quadro que ainda faltaria aprovar, não existindo, assim, um prejuízo directo por parte dos AA., agora Recorrentes.
Tal decisão foi, posteriormente, sufragada pelo TCA Sul, por via do seu Acórdão, de 15-05-08, que, assim, manteve a pronúncia emitida pelo TAF quanto à ilegitimidade dos AA. (cfr. fls. 236-240).
Ora, em face do quadro em que se moveu o Acórdão recorrido temos que a questão a dirimir no âmbito da presente revista se apresenta como de especial relevância jurídica, por passar, designadamente, pela densificação do conceito de prejuízo “directamente resultante da situação de omissão”, a que alude o nº 1, do artigo 77º do CPTA, para efeitos de legitimidade activa dos AA, pressuposto este que, eventualmente, poderá ser apreciado por referência a parâmetros essencialmente normativos, quer os contidos no CPTA, quer os decorrentes das garantias contenciosas acolhidas no texto constitucional, portanto com um alcance que extravasa significativamente do caso concreto e poderá servir de referência interpretativa da norma em causa noutras situações, sendo que, na situação em análise, a questão a que se reportam os Recorrentes se anuncia algo complexa, envolvendo a realização de operações exegéticas de uma certa dificuldade, o que tudo reclama a intervenção deste STA.”
A questão sobre a qual este Tribunal de revista é chamado a pronunciar-se circunscreve-se, assim, à delimitação do conceito de “prejuízo directamente resultante da situação de omissão”, a cuja invocação o nº 1 do art. 77º do CPTA reporta a legitimidade para o pedido de declaração de ilegalidade por omissão de normas de regulamentação de actos legislativos.
Tarefa interpretativa que será levada a cabo com referência aos parâmetros e princípios normativos basilares do CPTA, em matéria de legitimidade processual, naturalmente à luz das garantias contenciosas acolhidas no texto constitucional.
O acórdão sob revista, como vimos, confirmou a sentença do TAF que julgara procedente a excepção de ilegitimidade dos Autores, considerando prejudicado o conhecimento das demais excepções, e que, em consequência, absolvera os Réus da instância.
Limita-se, praticamente, a transcrever a decisão de 1ª instância, no que concerne ao fundamento nuclear dessa decisão: a inexistência, in casu, de um prejuízo directamente resultante, para os Autores, da situação de omissão.
Depois de citar o conteúdo do art. 77º, nº 1 do CPTA, e dos arts. 195º e 213º do Estatuto dos Militares da GNR, aprovado pelo DL nº 265/93, de 31 de Julho, na redacção que lhe foi dada pelo DL nº 15/2002, de 29 de Janeiro, ali se refere, no essencial, que “O novo meio processual criado pelo CPTA, que os ora AA pretendem utilizar para satisfazer as suas pretensões, contém uma norma especial de legitimidade, de carácter mais exigente do que as regras gerais estabelecidas no CPTA, sobre esta matéria” e que “o legislador não se basta com a aferição da existência de um "interesse" do autor, mas exige a alegação de "prejuízos", ou seja, este meio processual destina-se não apenas a satisfazer uma pretensão, mas a obviar a uma situação de lesão dos direitos dos particulares”, sendo certo que “os prejuízos directos a que a lei se refere não devem ser eventuais, mas actuais, no sentido de que da omissão de regulamentação decorra uma situação de dano imediato na esfera jurídica dos AA., o que não sucede no caso sub judice”, uma vez que “a frequência do tirocínio depende de admissão para o efeito, e o ingresso na carreira de oficial depende do processo de recrutamento e da existência de lugar em quadro que ainda falta aprovar”.
Conclui, assim, que “da ausência de regulamentação prevista no nº 6 do artigo 195º do EM/GNR não resulta directamente, para a esfera jurídica dos particulares, um prejuízo, pois a frequência do tirocínio depende de admissão para o efeito, e o ingresso na carreira de oficial depende do processo de recrutamento e da existência de lugar em quadro que ainda falta aprovar”, existindo pois “mais pressupostos aleatórios de que dependerá o objectivo dos AA”.
Discordando de tal decisão, alegam os recorrentes, em suma, que a interpretação acolhida no acórdão recorrido sobre o que deve entender-se por "prejuízo directamente resultante da situação de omissão" baseia-se em doutrina e jurisprudência antigas, contemporâneas do advento do Código Administrativo (1940) e do Regulamento do Supremo Tribunal Administrativo (1957), não atendendo aos objectivos do legislador do CPTA ao consagrar as acções administrativas especiais de declaração de ilegalidade por omissão de regulamentação de normas legais.
E que essa interpretação torna praticamente impossível o recurso pelos cidadãos a este tipo de garantia, pois a inexistência de uma norma regulamentar não é susceptível de, por si só, causar um prejuízo, pelo que se mostra infringida a tutela jurisdicional efectiva dos direitos ou interesses legalmente protegidos consagrada nos nºs 4 e 5 do artigo 268º da Constituição.
Vejamos.
A pretensão judiciária formulada pelos Autores, ora recorrentes, no âmbito da acção administrativa especial por eles intentada, é a de declaração de “ilegalidade por omissão de normas cuja adopção, ao abrigo de disposições de direito administrativo, seja necessária para dar exequibilidade a actos legislativos carentes de regulamentação” (art. 77º, nº 1 do CPTA), concretamente, a omissão da regulamentação prevista no nº 6 do art. 195º do Estatuto dos Militares da GNR, aprovado pelo DL nº 265/93, de 31 de Julho, na redacção que lhe foi dada pelo DL nº 15/2002, de 29 de Janeiro.
E o pedido que formularam foi o de que as entidades demandadas fossem condenadas a aprovar a regulamentação ilegalmente omitida.
O princípio geral de legitimidade activa estabelecido no art. 9º do CPTA (“o autor é parte legítima quando alegue ser parte na relação material controvertida”) evidencia o propósito claro do legislador de erigir todo o sistema judiciário – também o administrativo – em torno da figura da relação jurídica, no caso a relação jurídica administrativa.
A legitimidade activa surge no CPTA determinada pela regulamentação específica definida para cada um dos meios processuais previstos no Código, funcionando aquele princípio geral legitimador como um denominador comum a todos eles.
Por outro lado, a legitimidade processual no CPTA assenta num figurino de concretização do princípio da tutela jurisdicional efectiva: enquanto a legitimidade passiva se resguarda, na perspectiva de reduzir ao mínimo as objecções formais que possam colocar-se à apreciação de mérito da causa ou que de algum modo possam dificultar o acesso efectivo à justiça administrativa, a legitimidade activa expande-se, garantindo de forma mais abrangente a protecção jurídica dos particulares lesados por actuações ou omissões da Administração (cfr. Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Legitimidade Processual, CJA nº 34, pág. 23).
Na situação dos autos, somos confrontados com a disciplina contida no art. 77º, nº 1 do CPTA, que confere legitimidade para o pedido de declaração de ilegalidade por omissão de regulamentação de actos legislativos, para além do Ministério Público e pessoas ou entidades defensoras de interesses difusos, a quem “alegue um prejuízo directamente resultante da situação de omissão”.
O que está aqui verdadeiramente em causa é a omissão ilegal, por parte da Administração, do dever de regulamentar actos legislativos carentes de regulamentação, deste modo infringindo a própria determinação legal impositiva dessa regulamentação. Ou – na expressão de Mário Aroso de Almeida, O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos, 2ª ed., pág. 227, o “(in)exercício de um poder administrativo vinculado quanto ao an, uma vez que se trata do (in)cumprimento, por parte da Administração, do dever de dar exequibilidade, por via regulamentar, a determinações contidas em actos legislativos...”.
Como sublinha o Prof. José Carlos Vieira de Andrade, Justiça Administrativa (Lições), 8ª ed., pág. 253, a figura e a fórmula adoptada pelo legislador foram evidentemente inspiradas na fiscalização da inconstitucionalidade por omissão das medidas legislativas necessárias à exequibilidade de normas constitucionais (art. 283º da CRP), devendo aqui, em sede de omissão de regulamentação de actos legislativos, “tratar-se da omissão de regulamentos que se prove serem necessários à execução de preceitos concretos das leis em vigor, nos termos referidos no nº 1 do artigo 119º do Código do Procedimento Administrativo”.
O conceito de legitimidade utilizado pelo CPTA no art. 77º, nº 1 (reportado a quem “alegue um prejuízo directamente resultante da situação de omissão”) é relativamente vasto, como é típico das acções relativas a normas, mas que neste tipo legal se afigura um pouco mais exigente: o prejuízo tem que ser directo e actual.
Resta saber se essa exigência vai ao ponto de confortar o entendimento sufragado no acórdão recorrido de afastar, in casu, a legitimidade dos ora recorrentes para o pedido de declaração de ilegalidade por omissão de regulamentação, com o fundamento de que não há um prejuízo directamente resultante, para os Autores, da situação de omissão, uma vez que existiriam outros pressupostos aleatórios de que depende a pretensão formulada, como sejam a admissão e frequência do tirocínio e a existência de lugar em quadro que falta aprovar.
Dir-se-á, desde já, que não se sufraga tal entendimento.
A referência a quem “alegue um prejuízo directamente resultante da situação de omissão”, constante do nº 1 do art. 77º do CPTA, deve entender-se como reportada à invocação de um interesse individual, que pode consistir numa posição jurídica substantiva ou num mero interesse de facto, devendo, em qualquer caso, “tratar-se de um direito subjectivo ou de interesse de facto que derive directamente da norma, ou que seja por ela reconhecido, e que careça de regulamentação para se tornar exequível” (Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2ª ed., pág.453.
A esta luz, o prejuízo a que alude o preceito em causa reconduz-se à ofensa desse direito subjectivo ou interesse de facto, conferido ou reconhecido pela norma legal, ofensa essa consubstanciada na omissão ilegal da regulamentação que era necessária à sua exequibilidade.
Vejamos então a norma legal cuja regulamentação os Autores dizem ilegalmente omitida pela Administração, para se apurar se há ou não, para eles, um prejuízo directamente resultante da situação de omissão, à luz do disposto no art. 77º do CPTA.
A norma legal por eles invocada é o nº 6 do art. 195º do Estatuto dos Militares da GNR, aprovado pelo DL nº 265/93, de 31 de Julho, na redacção que lhe foi dada pelo DL nº 15/2002, de 29 de Janeiro, que dispõe:
"1 - O ingresso na categoria de oficial dos quadros da Guarda faz-se no posto de alferes, por habilitação com curso adequado ou, no caso dos licenciados admitidos por concurso nos termos de legislação especial prevista neste Estatuto, após a frequência de tirocínio de formação, com aproveitamento.
2 - Os alferes habilitados com curso são ordenados por quadros e cursos e, dentro de cada curso, pelas classificações nele obtidas.
3 - A antiguidade dos alferes a que respeita o número anterior é referida a 1 de Outubro do ano em que concluíram, com aproveitamento, o curso de formação, ou antecipada de tantos anos quantos os que a organização escolar do respectivo curso exceder cinco anos.
4 - A antiguidade dos alferes admitidos por concurso nos termos de legislação especial a que se refere o n.º 1 é referida a 1 de Outubro do ano em que concluíram o tirocínio, antecipada ou retardada de tantos anos quantos os que a organização escolar da respectiva licenciatura, somada à correspondente preparação militar e ao tempo de duração do estágio ou internato geral e complementar, no caso dos licenciados em Direito e Medicina, exceder ou for inferior a cinco anos.
5 - A ordenação na lista de antiguidade dos alferes mencionados no número anterior com a mesma antiguidade faz-se, em cada quadro, segundo a classificação final, resultante da média ponderada das classificações obtidas na licenciatura e no tirocínio, e, em igualdade de classificação final, de harmonia com o disposto no artigo 28º.
6 - As normas de ingresso nos quadros de técnico superior de apoio (SAP), de transmissões, informática e electrónica (TIE), de medicina (MED), de medicina veterinária (VET), de enfermagem e diagnóstico e terapêutica (TEDT) e de juristas (JUR) são definidas por portaria do Ministro da Administração Interna.
7 - Os militares que ingressarem na categoria de oficial dos quadros da Guarda prestam «juramento de fidelidade», em cerimónia pública."
(sublinhado nosso)
Por sua vez, o art. 213º do mesmo Estatuto, dispõe que:
"O recrutamento para oficiais dos quadros é feito entre alunos que frequentarem os cursos de formação de oficiais e, nos termos de legislação especial, os licenciados que pertençam aos quadros da Guarda ou tenham cumprido o serviço efectivo normal como oficiais das Forças Armadas, mediante a frequência do respectivo tirocínio de formação com aproveitamento."
O argumento em que assenta o acórdão sob revista é o de que a omissão de regulamentação não causou prejuízo directo aos Autores, uma vez que, para além da regulamentação omitida, existiriam outros pressupostos aleatórios de que depende a pretensão por eles formulada, concretamente a frequência do tirocínio e a existência de lugar em quadro que faltaria aprovar.
Ora, esta argumentação é, em nosso entender, falaciosa.
É que, em rigor, esses pressupostos aleatórios de que fala o acórdão recorrido são, afinal, a própria regulamentação reclamada pela norma legal em causa, o nº 6 do art. 195º do Estatuto.
Na verdade, o que a norma nos diz (bem como a do art. 213º, que dispõe sobre os moldes de recrutamento) é que o ingresso na categoria de oficial dos quadros da Guarda se faz, no caso dos licenciados admitidos por concurso nos termos de legislação especial prevista neste Estatuto, após a “frequência de tirocínio de formação, com aproveitamento” (nº 1), e que as normas de ingresso nesses quadros “são definidas por portaria do Ministro da Administração Interna”.
Esta Portaria nunca veio a ser publicada, apesar de a norma a regulamentar ser de Janeiro de 2002 (DL nº 15/2002).
Ora, prevendo a norma do nº 6 do art. 195º do Estatuto que as normas de ingresso nos quadros de oficiais “são definidas por portaria do Ministro da Administração Interna”, é óbvio que a Portaria de regulamentação tem obrigatoriamente que tratar das “normas de ingresso nesses quadros”, ou seja, da implementação do tirocínio de formação a frequentar pelos referidos licenciados.
Não faz, pois, qualquer sentido apontar a frequência do tirocínio de formação como um pressuposto aleatório que acresce à regulamentação omitida. Ela corporiza a própria regulamentação reclamada na norma legal e que nunca foi implementada.
Quanto à necessidade de lugar em quadro que faltaria aprovar, também isso faz parte da própria regulamentação a que alude a norma legal, sendo certo, de qualquer modo, que esse é um pressuposto-regra de ingresso em qualquer categoria, seja de oficial ou não, e que se impõe tanto aos licenciados como aos não licenciados habilitados com curso adequado (nº 1 do art. 195º do Estatuto).
Não restam pois quaisquer dúvidas de que, ao não publicar a portaria de regulamentação prevista no nº 6 do art. 195º do EMGNR, a Administração está, sem mais, e com essa omissão ilegal, a impedir os Autores, detentores de formação superior como Licenciados, de usufruírem do seu direito subjectivo, reconhecido na citada norma legal estatutária, de ingresso na categoria de oficial dos quadros da GNR, após a frequência de tirocínio de formação com aproveitamento, e no âmbito do preenchimento regular das vagas nos respectivos quadros, desfrutando consequentemente de todas as regalias inerentes a esse ingresso.
A isso se reconduz, in casu, o prejuízo directamente resultante da situação de omissão, a que alude o art. 77º, nº 1 do CPTA.
O acórdão sob revista fez, pois, incorrecta interpretação e aplicação da lei, designadamente do art. 77º, nº 1 do CPTA, ao confirmar a sentença de 1ª instância que julgou procedente a excepção da ilegitimidade dos Autores e absolveu os Réus da instância, decisão que não pode, pelas expostas razões, ser mantida, assim procedendo a alegação dos recorrentes.
(Decisão)
Com os fundamentos expostos, acordam em:
a) conceder a revista, revogando o acórdão recorrido, e julgar improcedente a excepção da ilegitimidade dos Autores;
b) ordenar a baixa do processo ao TAF de Almada para que conheça das demais excepções invocadas, cujo conhecimento considerou prejudicado, e, nada obstando, do mérito da acção.
Custas pelas entidades recorridas.
Lisboa, 11 de Março de 2010. – Luís Pais Borges (relator) – Rui Manuel Pires Ferreira Botelho – Alberto Acácio de Sá Costa Reis.

Portugal rejeitará blindados entregues fora de prazo

Rui Pereira garante que irá pedir indemnizações por incumprimento do contrato caso o material encomendado não chegue "no prazo máximo"

Indemnizações podem atingir os 300 mil euros

O Estado português irá rejeitar os blindados que sejam entregues fora de prazo e vai accionar as cláusulas penais (as indemnizações) em caso de incumprimento do contrato. Estas foram as garantias deixadas ontem pelo ministro da Administração Interna no Parlamento. Rui Pereira revelou ainda que todo o material encomendado para a PSP vai custar afinal cerca de dois milhões de euros (e não cinco milhões) devido à anulação de concursos por falta de propostas.

"Faltam chegar quatro blindados e, se não chegarem no prazo máximo, claro que não os aceitaremos. Se chegarem dentro do prazo, accionaremos a cláusula que diz que há uma quantia que será abatida no preço", disse Rui Pereira, numa audição parlamentar pedida pelo Bloco de Esquerda sobre a compra de equipamento para a cimeira da NATO, que decorreu a 19 e 20 de Novembro, em Lisboa.

O contrato de aquisição das seis viaturas blindadas, assinado a 15 de Novembro de 2010, tem um prazo para entrega do material de 30 dias e que termina no final deste mês. Só dois blindados foram entregues, mas o restante equipamento encomendado já foi recebido, assegurou o ministro, em resposta à insistência da deputada Helena Pinto do BE sobre que material já estava na PSP.

Em relação aos blindados que sejam entregues fora de prazo, o ministro garantiu que o Estado português vai accionar as cláusulas indemnizatórias previstas no contrato e se ultrapassar um certo período do atraso "o contrato é resolvido".

Rui Pereira sublinhou que o material não se destinava apenas à cimeira da NATO mas sim a "colmatar falhas" de equipamento da PSP. "Se fosse útil só para a cimeira não teria tomado a decisão", disse o ministro, referindo que a despesa total de aquisições para a PSP é inferior ao previsto. São cerca de dois milhões de euros, devido à falta de resposta do mercado, uma despesa que "não é excessiva tendo em conta o valor dos direitos que está em causa".

Questionado sobre o atraso da entrega do material, Rui Pereira reconheceu que tinha muitas dúvidas acerca da capacidade de cumprimento dos prazos por parte das empresas, mas que foram as próprias que criaram essas expectativas.

Já a escolha de adquirir o material através de ajuste directo (por consulta e não por concurso público) foi justificada com a natureza do equipamento, com a necessidade de trabalhar com empresas certificadas e com a "urgência" da aquisição. Mas, lamentou Rui Pereira, "infelizmente nem com este tipo de urgência [o material] chegou a tempo".

http://jornal.publico.pt/noticia/15-12-2010/portugal-rejeitara-blindados-entregues-fora-de-prazo-20831480.htm?utm_source=feedburner&utm_medium=feed&utm_campaign=Feed%3A+JornalPublico+%28P%C3%9ABLICO+-+Edi%C3%A7%C3%A3o+Impressa%29

Nuno Torres
Aluno n.º 17642

Resumo da evolução histórica dos modelos francês e anglo-saxónicos da Justiça Administrativa

Pretendo com este texto, responder de forma sucinta, ao desafio colocado pelo Prof. Vasco Pereira da Silva, sobre a evolução histórica dos modelos francês e anglo-saxónico da Justiça administrativa.
Anteriormente ás revoluções liberais, vigorava um sistema tradicional, caracterizado por uma indiferenciação e indivisão das funções administrativas e jurisdicionais - o rei exercia ambas as funções - e uma ausência de subordinação da Administração Pública ao princípio da legalidade, prejudicando, deste modo, as garantias dos particulares.
Todavia, após a Revolução Francesa, em 1789, e com a Grande Revolução em Inglaterra, em 1688, ambos os sistemas administrativos sofreram profundas alterações dando origem a dois modelos de Administração muito diferentes. Vejamos:
Sistema Francês
O contencioso administrativo francês surgiu com a Revolução Francesa, em 1789, adoptando um sistema de administração executivo. Segundo o Dr. Vieira de Andrade, o sistema administrativo francês, poderá igualmente ser designado como modelo objectivista por visar a "defesa da legalidade e interesse público".
Este modelo objectivista caracteriza-se, sobretudo, pela sujeição da Administração a tribunais próprios. A Revolução Francesa marcou a fase, a que o Prof. Vasco Pereira da Silva denomina de "pecado original" e que consiste na "promiscuidade entre as tarefas de administrar e julgar". Todavia, de facto, mesmo após a Revolução, os tribunais continuavam a ser constituídos por membros da antiga nobreza, tornando a separação de poderes pouco claro e de alguma forma confusa.
Com a Lei 16-24 de Agosto, surge o poder executivo, proibindo qualquer interferência do poder judicial na administração, impedindo o juíz de apreciar os actos da mesma. Neste sentido, foram criados os tribunais administrativos, nomeadamente o Conseil d'Etat, com o objectivo de serem estes a julgar a Administração. Todavia, não se tratavam de "verdadeiros" tribunais, revelando-se somente órgãos meramente consultivos que faziam parte da Adminsitração e julgavam com independência outros órgãos desta.
Os tribunais actuavam na lógica que "julgar a Administração é ainda administrar" proibindo assim os tribunais comuns de interferir na esfera da Administração.
Parece-me uma "turva" definição e distorção do princípio da separação de poderes. De acordo com o Prof. Freitas do Amaral existe uma "interpretação peculiar da separação de poderes" e que poderá ser entendido como uma "concepção rígida da separação de poderes", ou seja, se o poder executivo não poderia interferir no poder judicial, também o poder judicial, em caso algum, poderia interferir no funcionamento e gestão da Administração Pública.
Sistema Britânico
Por sua vez, o sistema administrativo Britânico, de administração judiciária ou, segundo o Dr. Vieira de Andrade, denominado modelo subjectivista, apresenta como características fundamentais, a separação de poderes, através da consideração dos poderes administrativos e judiciais como poderes autónomos e independentes que se limitam um ao outro.
Em 1689, com o Bill of Rights, consagra-se os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos Britânicos, submetendo todos, incluindo o rei e a administração às regras de direito comum. Neste modelo, os tribunais comuns gozam de amplos poderes de jurisdição, não apenas em relação à Administração Pública, como q qualquer cidadão ou entidade privada, assegurando um combate eficaz á ilegalidade e abuso por parte da Administração, garantindo, desta forma, uma melhor protecção dos particulares. Segundo o Prof. Freitas do Amaral toda a administração está submetida " ao direito comum, o que significa que por via desta regra, não dispõem de privilégios ou de prerrogativas de autoridade pública".
No desenvolvimento do sistema britânico assistiu-se também a uma especialização do contencioso administrativo: em 1977, a da criação de um tribunal especializado para conhecer das questões de direito administrativo - a Queen's Bench Division.
Em suma, parece-me ser possível afirmar que o confronto entre estes dois sistemas, representam o contraste de modelos de Justiça Administrativa. Contudo é de realçar que, com o surgimento e no contexto da União Europeia, os sistemas tendem cada vez mais comuns nos seus Estados Membros. Ao longo dos anos tende-se ao aperfeiçoamento dos sistemas administrativos, de forma a tutelar-se simultaneamente o interesse público de todos e os direitos e interesses dos particulares.
Raquel Aiveca
Subturma 1
Aluna N.º 16940

Despacho Saneador

Procºnº1-2010.BELSB

Acção Administrativa Especial

Despacho Saneador

Artº 87 nº al a) do CPTA

Data: 14/12/2010

Intervenientes:

Autores: Francisco d’Esperto

Somos de Inteira Confiança Lda

Réu: Ministério da Administração Interna

  1. Saneamento

O tribunal é absolutamente competente.

As partes têm capacidade e personalidade judiciária, são legítimas e estão devidamente representadas.

O processo é próprio e válido.

Apreciando e decidindo as excepções suscitadas:

Processo nº 123/10.BELSB

Ineptidão da p.i.:

Alegou a entidade demandada não conseguir concluir qual o pedido formulado, considerando o mesmo ininteligível.

O autor pronunciou-se no sentido de solicitar a condenação da Administração à prática do acto de resolução do contrato administrativo de fornecimento de veículos blindados.

Em face do que se referiu julga-se que não lhe assiste razão, uma vez que, apesar do pedido não estar expressamente formulado consegue-se extrair do Artº 17 da p.i. qual a pretensão do Autor.

Com efeito, para tanto se dirá que o teor da p.i. apresentada em juízo demonstra que o pedido formulado é claro e certo.

Assim sendo, considera-se a não procedibilidade da ineptidão da excepção suscitada.

Da ilegitimidade:

Alegou também o demandado que o autor é parte ilegítima nos presentes autos, dado que o mesmo não alegou os pressupostos da Acção Popular previstos no Artº 52 da CRP, bem como no Artº 1 nº 2, da Lei nº 83/95 de 31 de Agosto.

O autor pronunciou-se no sentido de existir uma lesão do património financeiro do Estado sem contrapartida de utilidade.

Em matéria de legitimidade, considera-se que estão reunidos os pressupostos dos Artºs 52 nº 3, al. b) da CRP conjugado com a Lei nº 8/95 de 31 de Agosto.

Improcede, assim, a excepção da ilegitimidade suscitada.

Processo nº 123/10.1BELSB

Ineptidão da p.i.

Alegou a entidade demandada que o pedido formulado por A é ininteligível uma vez que pede “algo que não existe”.

O autor pronunciou-se no sentido da declaração de anulação do contrato celebrado pelo Ministério da Administração Interna e a General Dynamics, por violação de procedimento concursal obrigatório com adjudicação por ajuste directo, bem como a condenação ao consequente lançamento do concurso público internacional de aquisição de 2 veículos blindados.

Subsidiariamente, A. pede ainda a condenação ao pagamento de uma indemnização no valor de € 200.000, com base em danos resultantes dos actos por esta celebrados, com vista à participação no concurso e consequente violação da sua expectativa jurídica, fundada na comunicação oficial da intenção de aquisição das referidas viaturas.

Em face do que se referiu julga-se que não lhe assiste razão.

De facto, para tanto se dirá que o teor da p.i. apresentada em juízo demonstra, sem margem de dúvida, que o pedido formulado é claro e certo.

Assim sendo, considera-se a não procedibilidade da excepção suscitada.

Da ilegitimidade

Alegou também a entidade demandada que o autor é parte ilegítima nos presentes autos, com o fundamento nos pressupostos constantes no artº 40 nº1 g) do CPTA, interpretado a contrario, considerando que A não é titular de direitos subjectivos e interesses legalmente protegidos e por este apenas alegar interesse, não sendo por isso parte legítima, nos termos do artº 9 e artº 40, nº 5 do CPTA.

O autor pronunciou-se no sentido de ter participado e ganho vários concursos públicos internacionais de fornecimento do mesmo equipamento, sendo conhecedor dos procedimentos que envolvem este tipo de aquisições, fundamentando o seu interesse, cfr artº 34º, 35º, 36º, 37º, 38º, 39º, 40º e 41º da p.i.

Em matéria de legitimidade, o CPTA, nos artº 9º, nº 1, artº 55º, nº1, al a) e artº 68, nº 1 a), acolheu o modelo do artº 26 do CPC, baseando-se, para determinação da legitimidade processual, com alegação da qualidade de parte na relação material controvertida ou, no caso da acção administrativa especial, com alegação da titularidade de um interesse directo e pessoal na impugnação do acto, por parte do autor.

Com efeito, verifica-se que A. é parte legítima porque alega ser titular de um interesse directo, considerando que, na perspectiva subjectivista do Contencioso Administrativo, o que está em causa não é o acto mas a lesão provocada na esfera do autor, nos termos dos artº 55º nº 1 a) conjugado com o artº 9º nº 1, ambos do CPTA.

Improcede, assim, a excepção da ilegitimidade suscitada.

Ilegalidade da cumulação:

O demandado alega que não se verifica nenhuma situação de cumulação de pedidos, nos termos do artº 4, nº 3 do CPTA e solicita a procedência da excepção.

O autor cumulou o pedido de anulação do contrato com a condenação ao lançamento do concurso público internacional devido.

Segundo o artº 47, nº 2 a) do CPTA, o pedido de anulação de um acto administrativo pode ser cumulado com o de condenação da administração na prática do acto que seria legalmente devido, na situação em causa, cumulando-se assim o pedido para que se anule um acto ilegal com o da sua substituição pelo acto que deveria ter sido praticado.

Pelo que não procede a excepção da ilegalidade da cumulação.

  1. Matéria assente

Foi celebrado entre o MAI e a General Dynamics um contrato de fornecimento de 2 veículos blindados, no valor de € 1.200.000,00 para serem utilizados pelas forças policiais durante a cimeira da NATO que se realizou nos pretéritos dias 19 e 20 de Novembro.

A forma de contratação foi o ajuste directo com fundamento na urgência da encomenda para a referida Cimeira. No entanto, os veículos em causa não foram entregues em tempo.

Apesar do incumprimento, o MAI manteve o interesse não resolvendo o contrato.

Em conferência de imprensa realizada no dia 27 de Outubro de 2009 o Exmº Senhor Ministro da Administração Interna afirmou a necessidade de aquisição dos veículos blindados para a manutenção da ordem pública na Cimeira, supra referida, reafirmando a mesma necessidade em discurso efectuado na Escola Superior de Polícia no dia seguinte.

O dano patrimonial no valor de 200.000 € (duzentos mil euros) resultantes dos actos celebrados com vista à participação no concurso e consequente preterição do mesmo, alegado pela empresa “Somos de Inteira Confiança”.

  1. Base instrutória

- Manutenção do contrato de aquisição dos veículos blindados?

- Urgência na contratação por ajuste directo?

- Preterição de concurso público?

- Expectativas da empresa “Somos de Inteira Confiança, Lda” na selecção para o Concurso Público?

Nada mais cumpre promover.

  1. Do valor da causa:

Ao presente processo é aplicável o disposto no Artº 32 do CPTA

Notifique.

Lisboa, 14 de Dezembro de 2010

O Juiz,

Marcolino da Silva Ambrósio