domingo, 17 de outubro de 2010

Análise e evolução histórica dos modelos Francês e Anglo-saxónico

Para fazer face à tarefa proposta pelo Sr. Professor, proponho-me apresentar uma breve analise e evolução histórica dos modelos Francês e Anglo-saxónico.

Existem momentos históricos marcantes no desenvolvimento do Contencioso Administrativo. Um desses momentos surge com a Revolução Francesa, sobretudo através de jurisprudência do Conseil d’Etait . Assenta numa ideia radical de separação de poderes, onde é concebido o “privilégio do foro”. Um Contencioso especial para a actuação de direito público da administração, destinado a garantir os poderes e defesas públicas e não assegurando os direitos dos particulares.

Os tribunais administrativos não são em regra, verdadeiros tribunais, mas órgãos administrativos independentes, embora actuando segundo um processo jurisdicionalizado.

Este sistema assenta na confusão entre a função de administrar e de julgar. Pelo princípio da separação de poderes os tribunais judiciais não podiam interferir na administração, considerando que “julgar a administração é ainda administrar”.

Com esta afirmação denota-se uma maior preocupação com a garantia e autonomia da administração do que com a protecção dos particulares. Autonomia consagrada no «Acórdão Blanco».

Surgem duas realidades no contencioso administrativo: o modelo Francês e o modelo Anglo-saxónico, ambos partem da ideia assente no Estado Liberal, mas o modelo Francês teve muita influência do Antigo Regime.

No modelo Anglo-saxónico emergem novas intenções associadas à ideia de uma “protecção plena e efectiva” dos administrados, que propugnam por um modelo predominantemente subjectivista.

Este modelo procura a instituição de uma verdadeira “Justiça Administrativa” (jurisdição total, material, processual e orgânica), dentro da lógica própria e comum a todos os tribunais.

Procura o desenvolvimento dos meios de jurisdição plena, onde o juiz disponha de poderes de decisão diversificados, quando estejam em causa lesões dos direitos dos particulares, a fim de lhes garantir uma protecção judicial efectiva.

No modelo Francês por detrás da Administração “esconde-se” o Estado, e, vai obrigar à criação de um contencioso “especial”, pois é impensável o seu julgamento por um qualquer juiz, dado que é uma realidade de “privilégios exorbitantes”.

Com a instauração do modelo de Estado Social procura-se criar uma Jurisdição autónoma.

Mas só paulatinamente é que o direito administrativo vai deixando de ser “direitos especiais” de Administração, para se tornar no direito regulador das relações jurídicas administrativas.

Verifica-se a passagem de um “quase - tribunal” para um verdadeiro tribunal, pela sua actuação.

O que significa que nesta fase em ambos os sistemas são tribunais autónomos e independentes a controlar a administração.

No modelo francês os tribunais especiais dão origem a uma jurisdição autónoma, no modelo anglo-saxónico os tribunais comuns dão origem a uma jurisdição autónoma.

No período do Estado Pós - Social, verificamos a reafirmação da independência e plenos poderes do juiz face à administração, assim como, a consagração do modelo subjectivista, como tutela da protecção integral e efectiva dos particulares.

A afirmação desta dupla dimensão – jurisdicional e subjectivista é realizada ao nível do Direito Constitucional (tendo como fontes a jurisprudência) e ao nível do Direito Europeu (por força de órgãos comunitários).

No modelo Francês esta afirmação vai realizando-se paulatinamente pelo Conselho de Estado ao longo do século XX.

O Contencioso Administrativo passa a ser tarefa de verdadeiros tribunais, e não de órgãos dependentes da administração, gozando os particulares do direito de aceder a esses tribunais para sua protecção perante a administração.

No modelo anglo-saxónico decorreu ao longo do século XX, através do estabelecimento de regras e princípios próprios, acabando nos anos 70, por adquirir dimensão Constitucional.

A especialização é visível a três níveis:

A criação de um tribunal especializado em matérias administrativa, surgindo como resposta às dificuldades e limitação dos tribunais comuns;

O estabelecimento de regras processuais especiais para o julgamento dos litígios administrativos, assim como a tendência para a concentração de todos os poderes de controlo da Administração pelo juiz;

Reorganização do relacionamento entre garantias administrativas e contenciosas de modo a aumentar a eficácia do sistema permitindo a possibilidade de impugnação perante um tribunal das decisões dos órgãos administrativos especiais.

A par da Constitucionalização, a mudança do paradigma do contencioso administrativo é também o resultado da sua “Europeização”.

A europeização procura um aperfeiçoamento dos meios processuais, tanto nos domínios de contratação pública, das providências cautelares, como de convergências das legislações nacionais.

Actualmente o fenómeno da europeização é evidente no processo administrativo, tanto a nível interno como externo.

Nos nossos dias, o Direito Administrativo que nasceu como o “direito dos privilégios exorbitantes” da Administração com o auxílio do Direito Constitucional e do Direito Europeu, passou a ser o Direito das relações jurídicas administrativas. Assim como o Contencioso Administrativo destinado à protecção plena e efectiva dos Direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares, por um Tribunal imparcial e independente.


Susana Vital, 17806

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