sábado, 30 de outubro de 2010

Competência dos tribunais administrativos

Jurisdição dos tribunais administrativos

Alínea e) do artigo 4.º do ETAF

Artigo 4.º

(Âmbito de jurisdição)

1. Compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham nomeadamente por objecto:

e) Questões relativas à validade de actos pré-contratuais e à interpretação, validade e execução de contratos a respeito dos quais haja lei específica que os submeta, ou que admita que sejam submetidos, a um procedimento pré-contratual regulado por norma de direito público.

Da letra da alínea e) podemos concluir que pertence à jurisdição administrativa o conhecimento dos litígios relativos à:

a) Validade de actos pré-contratuais (ex. adjudicação), de contratos a respeito dos quais haja lei específica que os submeta, ou que admita que sejam submetidos, a um procedimento pré-contratual regulado por norma de direito público;

b) Interpretação, validade e execução de contratos a respeito dos quais haja lei específica que os submeta, ou que admita que sejam submetidos, a um procedimento pré-contratual regulado por norma de direito público.

Neste sentido, é possível afirmar que não é tido em conta a qualidade das partes intervenientes no contrato (poderá ser uma ou duas pessoas colectivas de direito público ou apenas entre privados), a sua natureza e regime (disciplina da relação contratual) ou tratarem-se de contratos administrativos ou contratos de direito privado (resultado da fase pré-contratual).

O factor determinante da justiciabilidade administrativa dos litígios abrangidos por esta alínea é a existência de lei específica que os submeta, ou que admita que sejam submetidos, a um procedimento pré-contratual regulado por norma de direito público.

Existindo uma lei específica todos os litígios sobre a validade de actos que hajam sido praticados ou omitidos como precedentes da atribuição ou adjudicação e da celebração de contrato pertencem sempre à jurisdição administrativa.

Logo, se a administração estiver obrigada a recorrer a uma procedimento administrativo contratual e, em vez disso, recorrer a uma forma de pré-contratual privada, as questões que se suscitem são do foro administrativo.

Estão também sujeitos à jurisdição administrativa quaisquer contratos (administrativos ou não), que lei específica submeta, ou admita que sejam submetidos, a um procedimento pré-contratutal regulado por norma de direito administrativo. Mesmo se a fase administrativa pré-contratual não é obrigatória, mas em que seja admitida a sua possibilidade, não deixa de estar sujeito à jurisdição administrativa.

A fim de esclarecer o âmbito de aplicação da alínea e) do n.º 1 do artigo 4.º, recorri ao acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA) de 14 de Julho de 2010.
Link para o acórdão: http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/3fa9800c53beaa8c8025776c004e8044?OpenDocument&Highlight=0,compet%C3%AAncia
Resumo do acórdão:

a) Um Hospital (EPE), abriu um concurso para aquisição de 18 veículos automóveis para distribuição de refeições. O programa do concurso estabelece que o concurso se regula nos termos do Regulamento de Aquisição ou locação de Bens e Serviços e Empreitadas de Obras Públicas do Hospital;

b) Candidataram-se a concurso uma sociedade anónima e uma sociedade por quotas, tendo sido seleccionada a sociedade por quotas, sendo celebrado o respectivo contrato;

c) A sociedade anónima demandou o Hospital e a sociedade por quotas escolhida, tendo em vista obter a anulação do acto de adjudicação praticado no concurso a que se submeteu, sendo preterida;

d) A acção foi intentada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, a Juiz declarou o tribunal incompetente materialmente para conhecer a acção de contencioso pré-contratual, cabendo desta forma aos tribunais judiciais dirimir este litígio;

e) Inconformada, a sociedade anónima, interpôs recurso para o Tribunal Central administrativo Sul, que negou provimento ao recurso, mantendo a decisão judicial da 1.ª instância;

f) Não concordando com a fundamentação apresentada, nos termos do artigo 150.º do CPTA, a sociedade anónima interpõe recurso de revista excepcional para o STA. O recurso fundamenta-se na aplicação das alíneas b) e e) do n.º 1 do artigo 4.º do ETAF, e que todo o processo de contratação foi regido por normas de direito público e que a entidade contratante é uma pessoa colectiva pública, realizando actos de gestão pública, pelo que, no seu ponto de vista, os tribunais administrativos são competentes;

g) O Hospital é uma Entidade Pública Empresarial (EPE), integra o sector público empresarial do Estado, sendo qualificado como sendo uma empresa pública;

h) O artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 233/2005 (actualmente revogado pelo artigo 14.º do Decreto-lei n.º 18/2008, de 29 de Janeiro), determinava que a aquisição de bens e serviços e a contratação de empreitadas pelos hospitais E.P.E regem-se por normas de direito privado, sem prejuízo da aplicação do regime de direito comunitário relativo à contratação pública. Neste sentido, o STA afastou a aplicação da alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º do ETAF por entender que não é pelo facto de o contrato objecto do concurso em causa ser um contrato público que o acto de adjudicação impugnado tem natureza administrativa e que a jurisdição administrativa é competente para dele conhecer;

i) Foi também afastada a aplicação da alínea e) do n.º 1 do artigo 4.º do ETAF, por se ter entendido que o contrato público não se encontra abrangido pelo âmbito objectivo da directiva 93/36/CEE, que estabelece limiares para a aplicação (sucessivamente alterados), atendendo que o valor do contrato é inferior ao limiar estabelecido, embora esteja preenchido o âmbito pessoal da referida directiva. Não existe assim uma Lei que submeta os actos pré-contratuais, ou que admita que podem ser submetidos, a um procedimento pré-contratual regulado por norma de direito público;

j) Desta forma, foi negado provimento ao recurso, afastando-se a jurisdição administrativa no dirimir do litígio.
José Arlindo Varela Pereira
SubTurma 1

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