sábado, 20 de novembro de 2010

É possível um modelo puro?



Para responder à questão é necessária uma análise comparativa dos modelos francês e anglo-saxónico e é importante marcar a diferença do ponto de partida de cada um dos modelos. Assim, enquanto o modelo francês nasce de um modelo objectivista onde o interesse público e a defesa da legalidade de actuação da Administração eram o seu desiderato, no modelo anglo-saxónico a trave mestra do modelo era assente no subjectivismo e na tutela dos direitos e das posições jurídicas dos administrados.

Os dois modelos no seu estado mais puro permite analisar o Contencioso Administrativo actual no sentido de tirar uma conclusão se é importante o ponto de partida do modelo e se o resultado final dos diferentes modelos é assim tão diferente…

O modelo objectivista tendo como paradigma o controlo de legalidade permite uma maior flexibilização na legitimidade activa enquanto presusposto processual, na medida em que assenta fundamentalmente em recursos de anulação de actos da administração  consubstanciados no controlo de legalidade do exercício autoritário de poderes administrativos. No modelo objectivista os particulares assumem uma posição de auxiliares do controlo da legalidade da actuação administrativa.

O modelo subjectivista tem como escopo a protecção de direitos subjectivos é garantido através de um processo de partes propugnando por uma maior igualdade das partes em processo. O ponto de partida do modelo subjectivista é a violação de um direito subjectivo por uma actuação da Administração e o objectivo final será a reparação da violação do direito subjectivo do particular.

Avançados nesta análise coloca-se indelevelmente a questão:

Será possível a adopção de um modelo objectivista ou subjectivista puro?

Dividindo a questão material em dois prismas podemos ter:
Pode o modelo objectivista garantir também os direitos subjectivos dos particulares?
Pode o modelo subjectivista garantir também o interesse público e o controlo de legalidade da actuação da Administração?

A resposta às perguntas anteriores pode passar por uma breve análise da evolução histórica dos dois modelos.

O modelo objectivista nasce com o objectivo do controlo de legalidade. Este ponto de partida tem um enquadramento histórico no Liberalismo da pós Revolução Francesa e está directamente associado a uma necessidade de controlo de actuação da Administração Pública. A legalidade representava a actuação vinculada da Administração e garantindo o seu rigoroso cumprimento, era possível garantir que a Administração desenvolvia a sua actividade enquanto poder distinto do poder político. A autotutela do controlo de actuação da Administração nasce com o objectivo principal do afastamento do “fantasma nobiliástico” associado aos juízes que exerciam à época o poder jurisdicional. O modelo objectivista com a evolução da forma de actuação do Estado de um Estado “agressor” para um Estado “prestador” obrigou ao tempero do exclusivo controlo de legalidade com a existência de acções para defesa dos interesses particulares.

O modelo subjectivista desenvolve-se numa sociedade não corrompida pela necessidade de afastar uma classe social que ocupava determinados cargos públicos e assim a sua génese centra-se numa realidade de protecção de direitos subjectivos afectados pela actuação da administração. No modelo subjectivista verifica-se a sua insuficiência ou falta de apetência para garantir eficazmente a tutela de interesses não individualizáveis mas materializáveis em interesses comuns ou interesse público.

Para finalizar esta breve análise, a conclusão será obrigatoriamente que, sendo o ponto de partida um modelo objectivista ou subjectivista, dada a abragência da actuação da Administração, há dois objectivos distintos a proteger, os direitos individuais dos administrados e o interesse público resultado final da actuação material da Administração, não havendo uma resposta eficaz por parte de nenhum dos modelos apresentados na sua concepção mais pura.

No caso português após a reforma de 2002 o modelo implementado foi um modelo subjectivista mas temperado com apontamentos de objectivismo materializados através da “acção particular”, o alargamento da legitimidade nas “acções populares” e a legitimidade do Ministério Público enquanto “auxiliar de justiça, em defesa da legalidade”. Esta solução permite um equilíbrio entre subjectivismo e objectivismo, que, embora permitindo o alcance dos dois objectivos, embora focada essencialmente no prisma da protecção dos direitos subjectivos.

A resposta ao assunto do presente post é: Não! Qualquer dos modelos apresenta vantagens e desvantagens e uma solução eficaz tem de tentar conciliar “o melhor dos dois mundos”.

Nuno Mira Rodrigues
N.º 17697
ST1


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